No substack: esFOAMeados
Cá estamos nós de volta, depois de uma quente e refrescante pausa. Atentai!
TABELA DE CONTEÚDOS
SINOPSE
🎂 Nata da nata
- D. Arterial Periférica --> Tratamento invasivo sem vantagem inicial e com potencial de malefício face a conservador com exercício +- farmacoterapia.
- Abcesso hepático --> Drenagem eco-guiada com maior sucesso terapêutica se com catéter percutâneo (vs. aspiração de agulha fina)
- Neoplasia avançada que-não-melanoma --> Nivolumab isolado tão bom ou até melhor (menos EAs) que c/ ipilimumab
🍰 Nata
- HTA --> Tamanho do cuff influencia medições (CufZZ)
- FA --> Em idosos, substituir AVK por NOAC piorou desfechos (...mas doses incertas e não piorou se edoxabano) (FRAIL-AF)
- EAM --> Tratamento de lesões não-culprit em idosos diminuiu mortalidade (FIRE)
- Sal --> Estratégia educacional reduziu consumo...mas muuuito discretamente
- Ferro --> Melhor absorção se ingerido de manhã, com vitamina C, antes de pequeno-almoço e do café
- AVC --> Tratamento invasivo da PA (<140 e até <160) SEM BENEFÍCIO ou até MALEFÍCIO (OPTIMAL-BP e BEST-II)
- Cardiopatia por antraciclinas--> Atorvastatina atrasou progressão (STOP-CA)
🧾Receita
- WikiGuideline: Endocardite infecciosa
- Reabilitação pulmonar
🧐 Observações
- Revisões sistemáticas: Cannábis e revisão guarda-chuva
- Primários: Apendicite tratada medicamente | TCE e prognosticação | Prescrição racional de análises por internos | Fracturas de insuficiência em doentes reumáticos | Doença desmielinizante seronegativa e IgA anti-MOG | Pós-trombectomia e prognosticação | Avaliação pupilométrica automatizada | Tabaco e exposição em não-fumadores | Fluticasona/salmeterol genérico
- Casos e séries: Vasculite ANCA de grandes vasos
☝ Opiniões
- Revisão narrativa: Incerteza de vacinação, factos e mitos
- Perspectiva: Inteligência artificial e medicina
- Notícias: Exercício estático e PA | Genética e COVID | MERS nos EUA | D. Corpos Lewy e identificação precoce
🌎FOAMed
Anti-arrítmicos e IC | Abstinência alcoólica | Osteomielite e imagem
REVISÕES SISTEMÁTICAS de ECAs
Cardiovascular
9 ECAs / n~1.500, PRISMA/PROSPERO, Medline/WoS/GS, até 08/2022
P - Doença arterial periférica
I - Invasivo: endovascular ou cirúrgico
C - Conservador: exercício +- médico
O » IGUAL progressão para isquémia crónica, amputações e mortalidade total no seguimento médio de 3.5 anos
...mas se seguimento >5 anos, MAIS mortalidade
» MAIS revascularizações (óbvio...)
Comentário: Nada que espante, quando, aliás, já faz parte do tratamento recomendado nas várias revisões e guidelines começar com exercício e tratamento médico. Contudo, continuam a sair estudos (que confirmo com a minha observação na prática) em que se usa o tratamento invasivo em demasia e fora do recomendado. Que isto sirva para mudar práticas. Como nota final, parabéns aos autores! Cirurgiões vasculares a publicar evidência contra a sua própria prática (e bolso)? Não é assim tão comum.
Conclusão: Tratamento inicial invasivo de doença arterial periférica sem vantagem em relação a conservador e até com sinal para maior mortalidade.
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
10 ECA / n=1.287, PROSPERO/PRISMA/CRoB2.0, PubMed/WoS/Cochrane/Embase/Airiti/ClinicalTrials, <16/03/2022
P - Abcesso hepático
I - Drenagem por catéter percutâneo eco-guiado (contínua)
C - Aspiração por agulha percutânea eco-guiada (intermitente)
O 1º » MAIOR sucesso terapêutico - RR 1.16 (1.07-1.25), p<0.01 | I2 75%, p<0.01
Subgrupos: MAIOR sucesso se abcesso grande (>6cm ou >114ml) e qualidade dos ensaios
2º » Igual mortalidade - RR 1.35 (0.46-4.01), p=0.59 | I2=18%, p=0.30
Menor tempo até cura clínica » −2.53 dias (−3.54 a −1.52), p<0.01 | I2=94%, p<0.01
Igual duração de tto | Menor duração de atb EV » MD −4 dias (−5.99 a −2.10), p<0.01 | I2=94%, p<0.01
Igual recorrência e complicações
Risco de viés: Elevado em 10% | Moderado em 50% | Baixo em 40%
Maior ECA: Ahmed 2021, 500 doentes --> Concordante com O 1º
Comentário: Pergunta relevante, trabalho importante e resposta minimamente satisfatória. Acho que ninguém esperaria que a diferença entre as duas técnicas fosse gigante, e, tal como se verificou, dos 10 ECA pequenos, a DPC parece ser ligeiramente melhor a atingir sucesso terapêutico, sobretudo se abcessos maiores. É verdade que a heterogeinedade é grande (imagino que, sobretudo, pela dificuldade em definir sucesso terapêutico). Lendo o suplemento, todos os ECA usaram critério clínico de sucesso, maioria critério morfológico (diminuição de tamanho) e alguns critérios laboratoriais, o que não me parece mau. Outro factor que dá um pouco mais de confiança no resultado é que o maior ensaio, com 500 doentes, favorece a DCP. Por outro lado, não altera mortalidade, recorrência, complicações ou dias de internamento, pelo que, pelo menos na técnica actual, não será esta diferença que fará a maior diferença para o sucesso de tratamento de abcessos hepáticos.
Conclusão: Drenagem percutânea eco-guiada ligeiramente melhor para sucesso terapêutico que aspiração percutânea, mas sem melhorar desfechos mais relevantes como mortalidade, recorrência e complicações.
Oncologia
Nivolumab Plus Ipilimumab vs Nivolumab Alone in Advanced Cancers Other Than Melanoma | JAMA Oncology
8 ECAs / n=1.727, PRISMA, PubMed/EBSC Information Services/Embase/Cochrane Library
P - Neoplasia avançada que não melanoma
I - Nivolumab + Ipilimumab
C - Nivolumab
O » IGUAL sobrevida geral - OR 0.95 (0.85 - 1.06), p=.32
» MAIS eventos adversos grau 3 e 4 (OR 1.86, p<.001) e descontinuação do tratamento (OR 1.96, p<.001)
Comentário: Em primeiro lugar, sinal de alarme para a motivação do estudo. Não costuma ler introdução e discussão para me focar apenas no puro do trigo, mas neste saltou-me à vista que queriam estudar as neoplasias avançadas que não melanoma pelo "claro benefício no melanoma", citando apenas 1 ensaio com follow-up após 5 anos em estudo separado (ou seja: provavelmente com perda dos benefícios da aleatorização) para medir a sobrevida geral. Não me parece "claríssimo". Falando desta população, adição de ipilimumab sem benefício na sobrevida geral com aumento de eventos adversos. Talvez menos seja mesmo mais... Como nota final, mais uma vez, o PFS (sobrevida livre de progressão) não se relacionou com OS (sobrevida geral). Cuidado com o assumir que PFS é um bom desfecho! Se não acreditam na necessidade de cautela, espreitam esta revisão do Vinay Prasad publicada no JAMA Internal Medicine.
Conclusão: Ipilimumab sem benefício adicional ao nivolumab no tratamento de neoplasias avançadas que não melanoma.
ENSAIOS CONTROLADOS E ALEATORIZADOS
Cardiovascular
n=195, crossover, EUA (Baltimore, Maryland)
P - Adultos residentes na comunidade
I1-4 - 4 tipos de medição de PA (1 c/ cuff apropriado + 3 c/ cuff inapropriado
O 1º » Menor (-3.6) PAS c/ cuff largo | Maior (+4.8) PAS com cuff curto
Comentário: Cuff maior que o braço subestima a PAS enquanto que menor que braço sobrestima a PAS. Nada de novo, sobretudo para a "geração Harrison" (era uma das coisas que se estudava, parecendo que não talvez até seja das mais úteis para a prática), mas é sempre excelente quando confirmamos com "alta ciência" algo que achamos acontecer. Enquanto que a margem de erro anda por volta dos 3-5mmHg no geral, para "braços extra-largos" (cuff 40-55cm) a sobrestima é de 19mmHg, o que pode induzir muitos erros
Conclusão: Tamanho do cuff influenciou a medição da PA, sobrestimando se cuff demasiado pequeno e subestimando se demasiando grande. Por outras palavras: em magros podemos subestimar e em obesos podemos sobrestimar PA.
n=1.330 (2621 rastreados), não-oculto, pragmático, ITT, multicêntrico nos PBaixos, seguimento de 12 meses, 2018-2022
P - Idosos frágeis (=>75A + GFI=>3) c/ FA não-valvular + Antagonista vitamina K (AVK) + DFGe>30
Características: ~83A | IMC~27 | DFGe~63 | GFI>3 em 75% | FA permanente ~50% | CHADVASC2~4 | 4 classes de NOAC » 50% rivaroxabano | dose reduzida em 6%
I - Substituir AVK por NOAC - qualquer NOAC dos 4
C - Manter AVK - acenocumarol 1mg ou fenprocumon 3mg
» Ensaio suspenso depois de 163 eventos por malefício segundo protocolo
O 1º » MAIS hemorragia major ou clinicamente relevante não-major - 15.3 vs 9.4 %, HR 1.69 (1.23 - 2.32), p=.0012
*Kaplan-meier: curvas separam-se (para malefício) aos ~100 dias
*MAIS para rivaroxabano e apixabano | IGUAL para edoxabano
2º » Iguais eventos trombóticos - 2.4 vs 2.0 %, HR 1.26 (0.60 - 2.61)
» Mais hemorragia clinicamente relevante não-major | Igual hemorragia major
» Igual mortalidade
Comentário: Ainda não sei muito o que concluir deste ensaio. Mas vamos por partes. Em primeiro lugar, aplaudo os autores por tentarem responder a uma pergunta relevantíssima (nota: os países baixos / holanda têm sido muito fortes a nível de bons e importantes ensaios...o que será que faz um país tão pequeno chegar a este nível? aprendamos com este exemplo!). Os NOACs foram geralmente não-inferiores ou até superiores a antagonistas vitamina K nos vários ensaios (com excepção de dabigatrano), mas estes ensaios excluíram grande parte dos doentes idosos e com fragilidade. Houve um ensaio - ELDERCARE-AF - que demonstrou segurança e eficácia de edoxabano 15mg nestes doentes...mas comparado com placebo e não com varfarina/acenocumarol. Estes autores decidiram então partir para este ensaio com o pressuposto de que os NOACs seriam mais seguros. E arrisco a dizer que, talvez, este pressuposto terá levado a algum excesso de confiança que levou a um ensaio redondamente negativo. Depois de 163 eventos, o ensaio teve de ser precocemente suspenso por sinal de malefício na transição para NOAC, aKa mais hemorragia clinicamente relevante não-major (isto porque, separadamente, não houve aumento estatisticamente significativo de hemorragia major), isto com mortalidade exactamente igual. Mas vejamos. Em primeiro lugar, os NOACs foram usados à discrição, sendo que metade usou rivaroxabano e apenas 6% usou dose reduzida off-label, sem que saibamos que doses foram usadas nem que dose reduzida foi essa a não ser que "usaram as doses recomendadas nas guidelines e bulas". Porque não decidiram os autores registar as doses? Excesso de confiança, diria. Em segundo, o desfecho primário em si. Terá sido o melhor desfecho primário para motivar suspensão tendo em conta que hemorragia major manteve-se sem aumento claro e mortalidade exactamente igual? Não sei. Isto culmina na tabela das características basais, em que o braço dos NOACs têm mais doentes com FA permanente e persistente, cancro activo, história de hemorragia prévia e história de tromboembolismo prévio. Ou seja, doentes de maior risco. Num ensaio sem ocultação, pergunto-me se não terá havido algumas diferenças na alocação dos doentes ao braço de intervenção motivadas pelo excesso de confiança de base de que os NOACs seriam mais seguros, levando mais doentes de risco para este braço. Mas mais uma vez, não sei. Finalmente, apesar de ser uma hipótese, parece que com edoxabano não houve sinal de malefício, sendo o edoxabano, precisamente, o NOAC que parece mais indicado para idosos frágeis sem disfunção renal, como já nos provou o previamente mencionado ELDERCARE-AF. No final, fico com mais dúvidas que respostas, mas pode ser que a prova futura nos venha a esclarecer parte destas inquietações.
Conclusão: Transição de antagonista da vitamina K para NOACs (qualquer um em qualquer dose) em idosos frágeis com FA não-valvular e sem disfunção renal levou a mais hemorragia (sobretudo "clinicamente relevante não-major").
n=1.445, não-oculto, multicêntrico em vários centros de Itália, Espanha e Polónia, 2019-2022
P - =>75A + EAM c/ ind. para CAT (c/ ou s/ eST) + Tto culprit bem-sucedido + =>1 culprit (visual: >2.5mm e 50-99%estenose)
Exclusão: CABG prévio ou planeado + Culprit fora do tronco comum + EMV<1A
Pós-inclusão: ~80A | S/ est ~65% | Killip>1 ~29% | FEVE ~49% | Cor.Esq ~70% | Não-culprit activa ~45% / ICP não-culprit ~33% | Estenose não-culprit 50-90% em ~80%
I - Estudo fisiológico da lesão não-culprit e ICP se estudo positivo
C - ICP apenas da lesão culprit
O 1º » MENOS morte, EAM, AVC ou isquémia relacionada / revascularização - 15.7 vs 21 %, HR 0.73 (0.57-0.93), p=.01
2º » Menos morte - 9.2 vs 12.8 %, HR 0.7 (0.51-0.96) | Menos EAM - 4.4 vs 7 %, HR 0.62 (0.47-0.97) | Igual AVC
» Menos morte cardiovascular ou EAM - 8.9 vs 13.5 %, 0.64 (0.47-0.88)
» Iguais EA
Comentário: Estes resultados surpreenderam-me. Do (sempre muito pouco) que sabia, a prova sobre revascularização completa era fraca, sendo que o melhor ensaio - COMPLETE - foi negativo para redução de mortalidade. Não esperaria que o benefício fosse, portanto, superior nos idosos, muito pelo contrário...mas por isso aqui estamos, sempre em busca de um pouco de espanto. Não é que houve mesmo menor mortalidade? Sim okay, estatisticamente tangencial e com um índice de fragilidade de 9. Mas em que nenhum desfecho foi alterado desde protocolo até publicação e incluindo mortalidade por todas causas no desfecho primário! No entanto, características basais não parecem equilibradas a desfavorecer ligeiramente braço de culprit apenas (mais EAM e ICP prévio, mais FA, menos BB e estatinas...)...viés de sleecção por ausência de ocultação? Talvez. Finalmente, a aleatorização só foi depois do tratamento da culprit, o que pode ter levado a mais viés de selecção inicial. No entanto, não é um ensaio nada mau e mudou a minha forma de ver o tratamento das lesões não-culprit e, não sendo hemodinamista, talvez mude até a prática.
Conclusão: Tratamento de lesões não-culprit em idosos com enfarte (com ou sem eST) diminuiu desfechos orientados ao doente, incluindo mortalidade.
n=1576, ensaio em aglomerados, 60 comunidades de ~25 pessoas de 6 províncias da China, 2018-2019
P - Adultos "cozinheiros caseiros" (~4x/semana em casa)
I - Educação, ambiente de suporte e monitorização do consumo de sal
C - Habitual
O 1º » Diminuição de ~340mg/24h de excreção urinária de sódio em 12 meses
2º » Diminuição de PAS e PAD...mas -2 e -1mmHg...
Comentário: Okay, preambulando e declarando conflitos de interesses, desde prova científica recente (incluindo ensaios) que sou bastante apregoador da redução de consumo de sal. Este, na minha opinião, é dos principais perigos alimentares no que toca a mais mortalidade global, talvez até mais que o mal-amado nas conversas dietéticas açúcar. Mas vejamos o que este ensaio nos demonstrou: uma estratégia de melhoria de qualidade com enfoque nisso mesmo levou a diminuição ligeira de excreção urinária de sódio e muuuuito discreta de pressão arterial. Será isto clinicamente significativo? Tenho dúvidas. Comparando, o entusiasmante SaSS Trial, com uma mudança simples de sal de cloreto de sódio por sal de cloreto de potássio em doentes de risco, reduziu desfechos bastante relevantes como mortalidade. Portanto, este ensaio salgado sabe a pouco.
Conclusão: Estratégia de tentativa de redução de consumo de sal por famílias levou a ligeira diminuição da excreção urinária de sódio média e muito discreta diminuição de pressão arterial.
Hematologia
n=34 (de 122), não-oculto, crossover (participante como próprio controlo), Zurique, 2022
P - Mulheres saudáveis em idade fértil + Ferropénia sem anemia + Sem outras condições de saúde
I1 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Água
I2 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Ác.ascórbico 80mg
I3 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Ác.ascórbico 500mg
I4 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Café
I5 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Pequeno-almoço
I6 - Ferro 100mg (fumarato ferroso) + Água + Ingestão à tarde
O 1º » MAIS absorção com AA (sem dif. consoante dose) | MENOS absorção com café, pequeno-almoço e vespertina
Comentário: Interessantíssimo! Gosto muito quando estes conceitos baseados em ciência mais básica são testados na prática com estudos prospectivos em humanos...sobretudo se aleatorização!! Pois bem, parece que, realmente, ingerir o ferro com vitamina C, de manhã e uns tempos antes do pequeno-almoço e do café aumenta a absorção. Sim, é verdade, desfecho não relacionado com doença, bioquímico, surrogate, etc etc. Ainda assim, ao menos sabemos que estamos a dizer verdade quando fazemos recomendações quanto à forma de ingerir ferro e não a inventar. Não esquecer ainda que estes autores já tinham demonstrado o benefício de ingestão em dias alternados.
Conclusão: Ingestão de ferro com vitamina C matinal aumentou a absorção, ao passo que pequeno-almoço, café e ingestão vespertina diminuiram-na.
Neurologia
n=306 / 302, não-oculto, 19 centros na Coreia do Sul, 2020-2022
P - AVCi p/ OdGV + Trombectomia eficaz (TCI=>2b) + PAS=>140 (<2h após) + mRS prévio 0-2
I - Tratamento de HT intensivo » <140mmHg
C - Tratamento de HT habitual » 140-180mmHg
O 1º » PIOR mRS 0-2 aos 3 meses - 39.4 vs 54.4 % - 0.56 [95% CI, 0.33-0.96]; P = .03
» Igual HIC às 36h e igual morte relacionada com ep. de AVC aos 3 meses (...mas pior tendência numérica)
Comentário: Apesar de associação de malefício nos estudos observacionais e as guidelines desaconselharem redução intensiva de PA após AVC (mesmo se trombectomia), os 2 ensaios existentes não tiveram resultados iguais: o BP-TARGET (Lancet Neuro 2021) foi neutro e o ENCHANTED2/MT foi suspenso precocemente por malefício (Lancet 2022). O 2º mencionado usou inclusivé um cutoff ambicioso de <120mmHg, conseguindo aleatorizar 800 doentes. Agora, temos mais um ensaio nesta população, com um cutoff mais lato. Com 300 doentes e mesmo com PA não tão reduzida, os desfechos parecem piores com tratamento intensivo. Será suficiente para arrumar o assunto ou precisamos de um grande ensaio, arriscando fazer mal aos doentes? Talvez não...
Conclusão: Tramento intensivo de HT (alvo <140mmHg) levou a pior desfecho funcional aos 3 meses. Apesar de não haver claro aumento de hemorragia e morte, parece haver tendência numérica para tal.
n=120, ensaio de futilidade, não-oculto, 3 centros nos EUA, 2020-2022
P - AVCi p/ OdGV M1/M2 + Trombectomia eficaz (TCI=>2b)
I1 - Tratamento de HT intensivo » <140mmHg
I2 - Tratamento de HT intensivo » <160mmHg
C0 - Tratamento de HT habitual » 140-180mmHg
O 1º » Igual volume de enfarte e igual mRS 0-1 aos 90 dias
2º » Baixa probabilidade de sucesso em ensaio futuro com I1 ou I2
Comentário: Para fechar o tópico anterior, parece não haver mesmo necessidade de ensaios futuros, já que a probabilidade de que haja benefício é quase nulo (para não falar na possibilidade de malefício!)
Conclusão: Tramento intensivo e moderado de HT (alvo <140mmHg e <160mG) levou a iguais desfechos em ensaio de futilidade, sem probabilidade futura de benefício em ensaio grande.
Oncologia
n=300 (286), duplamente-oculto, 9 centros nos EUA e Canadá, 2017-2022
P - Adultos com linfoma e candidatos a antraciclinas-QT
I - Atorvastatina 40mg qd
C - Placebo
O 1º » MENOR declínio de =>10% na FEVE p/ valor final <55% » 9 vs 22 %, p=0.002
2º » Menor declínio de =>5% na FEVE p/ valor final <55% » 13 vs 29 %, p=0.001
Não sei o quão relevante é este surrogate nem percebo a plausibilidade biológica (há umas teorias mencionadas na introdução), mas fica aqui um ensaio original com um medicamento barato e resultados positivos.
NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICAS - GUIDELINES
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Eis que vem fresquinha, a nova WikiGuideline de Todd Lee, Brad Spelberg, Emily McDonald, Steven Tong, Noah Wald-Dickler e muitos outros! Depois da previamente publicada sobre ostomielite, o alvo agora é endocardite. Há boas e más notícias...boa notícia é que é mesmo muito interessante e recomendável lê-la, a má notícia é que, devido à baixa qualidade da prova existente só sobrou 1 recomendação das 19 perguntas existentes: usar terapêutica oral é válido e foi estudado em 3 ensaios controlados aleatorizados, desde que cumpridos alguns requisitos (nenhum deles dias de antibiótico endovenoso!): (1) estabilidade clínica sem indicação imediata para controle de foco ou procedimento / cirurgia cardíacos; (2) bacteremia resolvida ou em resolução; (3) esquema antibiótico oral ao qual o organismo etiológico é suscetível in vitro e que é apoiado por dados clínicos publicados; (4) via oral / gastrointestinal disponível (5) sem determinantes que tornem a terapia intravenosa a via preferencial (normalmente usado para IDU-IE).
Pneumologia
Pelos vistos, é a primeira guideline americana a recomendar directamente fisioterapia respiratória para doentes pulmonares que não DPOC. Resumo:
--> DPOC - estável (independentemente do grau de comprometimento da função pulmonar) e alta após exacerbação - devem fazer reabilitação pulmonar (forte recomendação). Ou seja, todos todos todos!
--> DPI devem fazer reabilitação pulmonar (forte recomendação).
?... Hipertensão pulmonar pode fazer reabilitação pulmonar, mas sem prova substancial de benefício. (nestes há menos benefício na dispneia e mais eventos adversos, pelo que incerto)
Tratamento presencial e telerreabilitação apresentam benefícios semelhantes (ambas recomendadas)
Reabilitação pulmonar de manutenção à consideração, mas benefício não comprovado (nenhuma recomendação).
ESTUDOS OBSERVACIONAIS
REVISÕES SISTEMÁTICAS COM ESTUDOS OBSERVACIONAIS (com ou sem ECA)
Geral, Geriatria & Paliativos
n=101 meta-análises (50 observacionais / 51 ECAs), AMSTAR2/GRADE
Não vou repetir todos os riscos e benefícios dos canabinóides, que estão muito bem descritos nesta revisão "guarda-chuva" de várias meta-análises. Fica no entanto claro que há muitos riscos desta terapêutica nada negligenciáveis, como eventos psicológicos/psiquiátricos (sobretudo psicóticos), náuseas/vómitos e diarreia, acidentes de viação e baixa tolerância. Sobretudo perigoso em adolescentes, adultos jovens e grávidas. Resta-nos uma questão de pesar tudo isto na balança...e, acima de tudo, aplicar o que se faz (ou deveria sempre fazer) na prova científica: aplicar a mesma lógica pré-teste para qualquer intervenção que queiramos testar aKa hipótese nula e não deixar que os ventos da moda nos despenteiem o juízo.
PRIMÁRIOS - SUB-ANÁLISE / COORTE / CASO-CONTROLO / INQUÉRITOS / A. ECONÓMICAS
Cirurgia, Ortopedia & MFR
n=137, seguimento de 25 anos após 2 ECA (anos '90),'90-'20
Nesta coorte pequena de seguimento da população de 2 ensaios "antigos" (anos '90) de tratamento conservador de apendicite (aKa sem cirurgia), >50% não passou por apendicectomia! (tendo em conta que ~50% destes passou por cirurgia logo no 1º ano) Interessante. Fora a matriz observacional e o tamanho pequeno, olhamos para isto como copo meio-vazio ou meio-cheio?
Doente crítico/urgente
n~2000, estudo prospectivo de validação de protocolo (BIG) da sociedade americana de cirurgia e trauma
Parece que estratificação dos doentes em 3 grupos da recente norma - BIG 1, 2 e 3 - associa-se a melhores desfechos e redução de utilização de recursos. Olhando a tabela não sei se mudará muito a prática portuguesa, mas aqui fica.
Geral, Geriatria & Paliativos
n~80-100 internos / ~20 especialistas por ano, estudo de melhoria de qualidade c/ intervenção prospectiva, ~3 anos
Estudo de melhoria de qualidade muito interessante. Primeiro, houve uma recolha através do registo médico electrónico e questionários da noção e prática dos internos sobre pedido de exames laboratoriais. Depois, houve uma intervenção com educação (sessões originais "Stop, Think, Does My Patient Need Those Labs?"), protocolização de alguns pedidos (evitando pedidos excessivos e/ou diários desnecessários) e discussões com especialistas (hospitalistas, sobre expectativas e comunicação). A intervenção associou-se a eficácia, como diminuição de 20% dos pedidos por semana no 1º ano, menos 15% de punções venosas diárias (87 para 94 %) e mais pedidos básicos / menos completos, com mudanças mantidas ao fim de 2 anos e percepção pelos internos de melhoria de qualidade. Excelente iniciativa. Como desvantagem talvez inevitável, foi uma intervenção sem aleatorização pelo que muito cuidado com assumpções de causalidade. No entanto, observar o acontecimento já é alguma coisa.
Imuno-mediadas
n=1750 RM, estudo retrospectivo em doentes consecutivos de centro terciário de reumatologia, Alemanha, 2016-2018
Dor no pé é um sintoma frequente, sobretudo em doentes com patologia osteoarticular como os com artrite reumatóide, e a causa muitas vezes não é óbvia. Estes autores pegaram em todas as RM de doentes com dor no pé e sem história de trauma durante 2 anos e viram que: doença inflamatória reumática em 65% ; fracturas de insuficiência em 7.5%, e na verdade mais prevalente se d. inflamatória ; quando têm fractura, múltipla em quase metade e apenas detectado em 1/3 dos RX prévios ; FR para fractura foram osteoporose, tabagismo e fractura prévia (corticóide não? não percebi se estudaram isso).
Neurologia
n=1.339 doentes e 110 saudáveis, coorte longitudinal (39 meses) multicêntrica (5 centros)
Existe um subgrupo de doentes com doença desmielinizante (mielite e/ou s. do tronco cefálico) seronegativa (AQP4 e MOG-IgG negativos) com anticorpos MOG-IgA. São também doentes com pouco envolvimento do nervo óptico e baixa percentagem de bandas oligoclonais no LCR.
n=781 (derivação) / 3.260 (validação), modelo com base em 19 variáveis de 7 ECAs de TEV no AVC
Neste estudo de criação de escala de prognóstico 1 dia após TEV sobrou este MR PREDICTS@24H com 9 variáveis - idade, NIHSS basal, mRS pré-AVC, diabetes, localização da oclusão, colaterais, grau de reperfusão, NIHSS em 24 horas e hemorragia intracraniana sintomática 24 horas após TEV. No final, foi um muito bom preditor de independência funcional e sobrevida.
n=514, coorte prospectiva multicêntrica em 13 hospitais e 8 países na Europa e América do Norte, 2020-2022
Para estudar se a avaliação pupilométrica automatizada estaria associada a desfechos neurológicos, estes autores estudaram doentes internados em UCI após lesão cerebral traumática, hemorragia subaracnóide ou hemorragia intracerebral. A intervenção consistiu em avaliação pupilométrica infravermelha automatizada a cada 4 horas durante os primeiros 7 dias após a admissão para calcular um score chamado NPi, com valores variando entre 0 e 5 (anormal se <3). Depois de 40.071 medições (~40 por doente) em doentes com ECG~8 (~30% morreram e ~50% tiveram =>1 NPi), encontraram associação do score com desfecho neurológico desfavorável e mortalidade hospitalar (OR 1.42 por cada aumento de 10% no NPi e OR 5.58, respectivamente).
Pneumologia
n=1397, coorte longitudinal (SPIROMICS), 2010-2021
Fumadores assintomáticos têm o mesmo declínio de função pulmonar e percentagem de DPOC mas menos exacerbações nos 2 a 10 anos de seguimento.
n=45.369, coorte retrospectiva de base de dados larga, PSM, 2018-2021
Não sei se precisava de ter visto o resultado deste estudo, mas aqui vai: genérico de fluticasona/salmeterol inalatório igual ao produto de marca. Supreendidos? Eu não.
CASOS CLÍNICOS e SÉRIES DE CASOS
Imuno-mediadas
Vasculite ANCA de grandes vasos? Espreitem.
OPINIÃO
REVISÃO NARRATIVA
Geral, Geriatria & Paliativos
Muito interessante. Abordagem racional e anti-maniqueísta com análise histórica. A ler.
PERSPECTIVA
Diagnóstico e Raciocínio Clínico
Podemos ganhar muito com os MLL mas ainda não estamos no ponto.
Geral, Geriatria & Paliativos
Algo que nos ajudaria a todos, profissionais e doentes.
NOTÍCIAS
Geral, Geriatria & Paliativos
Exercícios estáticos associados a menor redução de PA? Segundo uma MA de ECAs, sim.
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Presença de alelo HLA-B*15:01 explicará em parte SARS-CoV-2 assintomático? Talvez.
Caso de MERS nos EAU pela primeira vez desde 2021
Neurologia
Hiposmia e α-sinucleína podem ser identificadores precoces de D. de Corpos de Lewy
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Cardiovascular
Jul 28 2023 - Antiarrhythmic Drugs and CAD | This Week in Cardiology
Excelente reflexão crítica sobre anti-arrítmicos IC e prova científica
Geral, Geriatria & Paliativos
Destilando álcool do doente!
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Que exame de imagem pedir se suspeitamos de osteomielite e como interpretar?
ABA - Aumento de Benefício Absoluto | ARA - Aumento de Risco Absoluto | EBM - Evidence-based medicine | ECA - Ensaio controlado e aleatorizado | ITT - Intention-to-treat Analysis | MA - Meta-análise | MBE - Medicina baseada na evidência | NIT - Non-inferiority trial | NNH - Number needed to harm | NNT - Number needed to treat | PPA - Per protocol analysis | RR - Redução Relativa | RRA - Redução do Risco Absoluto | RS - Revisão Sistemática
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