Resumo da literatura médica mais recente inspirada em perfil hospitalista e mente generalista.
No substack: esFOAMeados
TABELA DE CONTEÚDOS
SINOPSE
🎂 Nata da nata
- iSGLT2 e IC --> Tempo até benefício estimado em 26 dias
- Choque cardiogénico por EAM --> VA-ECMO sem benefício
- Rastreio de neoplasia --> Ganho de mortalidade em quase nenhum dos rastreios realizados...e esta?
🍰 Nata
- Eventos atriais --> Malefício em anticoagular doentes com pacemaker e eventos atriais (NOAH-AFNET6)
- Paragem cardiorespiratória --> Sem benefício em transferir doentes para centros especializados (ARREST)
- ICFEp e Obesidade --> Sem surpresas, semaglutido também faz perder peso em doentes com ICFEp (STEP-HFpEF)
- Objectivos de cuidados --> Vídeos sucintos por "educadores paliativos" aumentaram o seu registo (VIDEO-PCE)
- Psoríase pustulosa generalizada --> Spesolimab (inibidor IL-36) pode ser eficaz...mas incerto se vantagem (Effisaiyl 2)
🧾Receita
🧐 Observações
- Revisões sistemáticas: POCUS e abcesso amigdalino | Estudos observacionais c/ simulação de ensaio (emulation)
- Primários: iSGLT2 e artrite gotosa | Sobreviventes de COVID-19 e mortalidade
- Casos e séries: Pitiríase rosada persistente | S. de Lemmel (obstrução biliar por diverticulo na ampôla de Vater) | Pneumonite linfóide intersticial e Tiroidite de Hashimoto | Estrongilodíase disseminada e Nefrite lúpica
☝ Opiniões
- Revisão narrativa: Pioderma gangrenoso
- Perspectiva: Medicina, redes sociais, MedEd (e FOAMed!) | Rastreio de neoplasia e objectivo
- Notícias: Demência e prescrição de antipsicóticos
REVISÕES SISTEMÁTICAS de ECAs
Cardiovascular
4 ECAs, n=567, PRSOPERO, Medline/Cochrane/EMBASE, até 06/2023
P - Choque cardiogénico relacionado com EAM
I - VA-ECMO + tratamento médico
C - Tratamento médico
O » IGUAL mortalidade (sem benefício particular em análise de subgrupos)
» MAIS hemorragia major OR 2·44 (1·55–3·84) | MAIS complicações vasculares OR 3·53 (1·70–7·34)
Comentário: Não vou comentar muito além do que o fiz na semana passada embalado pelo também recentíssimo ECMO-SHOCK. Esta meta-análise dos ECA vem nos dizer exactamente o mesmo: sem vantagem na mortalidade e mais eventos adversos. Talvez reforce ainda mais o não-benefício ao ver que nenhum subgrupo parece beneficiar. Que coisas como estas sirvam para que punhamos na cabeça de uma vez por toda que a esmagadora maioria das intervenções que fazemos e apregoamos sem terem sido testadas não são paraquedas.
Conclusão: Choque cardiogénico relacionado com EAM sem benefício (ver análise da semana passada)
5 ECAs, n=21.947, pesquisa sistemática de ECAs na PubMed até 09/2022
P - IC + Desfechos de mortalidade, eventos cardiovasculares e hospitalização por IC
I - iSGLT2
C - Placebo
O » Tempo mais curto até benefício (1º evento MCV ou ida ao hospital por IC) - 26 dias, p<.05
(mais curto se ICFEr)
Comentário: Os benefícios cardiovasculares dos iSGLT2 já não são novidade para ninguém. Este estudo, teve a ideia interessante de estudar a partir de quando é que se começou a sentir benefício nos ensaios existentes. Da pesquisa que fizeram sobraram 5 grandes ensaios: DAPA-HF, EMPEROR-Reduced, EMPEROR-Preserved, DELIVER e SOLOIST-WHF (este um pouco menor e mais controverso). Da média de todos, sobraram 26 dias até 1º benefício (mortalidade cardiovascular ou ida ao hospital por insuficiência cardíaca). Não acho um desfecho ideal, pois acharia muito mais relevante para o doente "1º evento de mortalidade total ou ida ao hospital", já que ele não se importaria muito (diria eu) de ir ao hospital ou morrer por IC ou outra coisa qualquer, quer é evitá-lo. Mas, por agora, é o que temos!
Conclusão: Dos doentes com insuficiência cardíaca que usam iSGLT2, o benefício cardiovascular começa a notar-se a partir do 26º dia, mas incerto quando é que se começará a notar o benefício global.
Oncologia
18 ECAs / n~2.100.000, PRISMA, MEDLINE/Cochrane, 6 rastreios oncológicos, pesquisa até 10/2022
P - Rastreio oncológico + >9anos seguimento + registo de mortalidade e tempo de vida ganho/perdido
Rastreios: Mamografia | Pesquisa de sangue oculto nas fezes, sigmoidoscopia ou colonoscopia | PSA | TC-pulmonar
Seguimento médio: 10 anos p/ colonoscopia, PSA e TC | 13 anos para mamografia | 15 anos para pesquisa de sangue oculto e sigmoidoscopia
I - Rastreio
C - Sem rastreio
O » MAIS tempo de vida ganho APENAS com sigmoidoscopia » +110 dias (0-274)
» IGUAL tempo de vida com mamografia e pesquisa de sangue oculto
» Igual/maior? tempo de vida com colonoscopia, PSA e TC
» Igual mortalidade total em todos excepto bordeline/menor com sigmoidoscopia » RR 0.98 (0.95-1.00)
Comentário: Em Outubro do ano passado, os resultados do NordICC chocaram parte da comunidade médica. Uma intervenção médica tão utilizada e apregoada como a colonoscopia, afinal, não reduziu a mortalidade total quando usada como rastreio de carcinoma colo-rectal (como o é em quase todo o mundo, incluindo Portugal). Muito debate gerou, e nós por cá também destácamos o ensaio e as várias fontes a favor e contra o rastreio que da discussão resultaram. Para quem não se lembra, pode voltar a ler. Agora, o 1º autor, o norueguês Michael Bretthauer (que concedeu uma entrevista ao Vinay Prasad e que aconselho todos ouvir, também está lá nas fontes) vem com esta excelente ideia. E se fizéssemos aqui uma revisão sistemática dos ensaios dos rastreios e comparássemos o tempo de vida ganho ou perdido, já que no que toca à mortalidade não saíamos da toca do debate? E assim foi. De todos, apenas a sigmoidoscopia demonstra claro impacto positivo. Embora não pareça lógico, existem teorias (atentai a tal entrevista) e muitos como o Vinay defendem que, à data, é o melhor rastreio com a melhor prova existente. Além de implicar menos custos para a sociedade, pela maior simplicidade do exame. Leiam, oiçam, aguardem as prováveis entrevistas que virão, e interpretem de vossa justiça. No meu caso, mesmo que eu queira muito mudar, o rastreio de CCR foge muitíssimo do meu controlo, tanto a nível nacional como hospitalar, e a decisão final para os meus doentes acaba por não ser nem minha nem, muitas vezes, o que seria ideal: do doente com base na melhor informação disponível a eles fornecida. Ou será? Esperaria sinceramente que sim.
Conclusão: De todos os rastreios oncológicos existentes com prova de ensaios controlados e aleatorizados com seguimento de pelo menos 9 anos, apenas a sigmoidoscopia resulta claramente em dias de vida ganhos.
ENSAIOS CONTROLADOS E ALEATORIZADOS
Cardiovascular
n=2.536, duplamente-oculto / duplamente-idiota, multicêntrico em 18 países europeus,
P - Eventos atriais de frequência elevada (EAFE) em dispositivo implantável + Sem FA + 1 FR p/ AVCi
Dispositivo implantável: Pacemaker, desfibrilhador, ressincronizador e gravador loop implantado
EAFE: Frequência atrial =>170bpm por >6min, sem limite superior de tempo, pelo menos 2 meses após a implantação do dispositivo
FR: IC, HTA, DM2, AVCi/AIT prévio, doença vascular arterial ou =>75 anos
Pós-inclusão » ~78 anos | CHADS-VASC ~4 | PM em 80% | EAFE por ~3 horas | EAFE de >200bpm em ~100% | AVC~1% | FA posterior em 18% (9%/doente/ano)
I - Edoxabano 60 ou 30 mg
C - Placebo
O 1º » IGUAL morte cardiovascular, AVCi ou embolia sistémica - 3.2 vs 4.0 %/doente/ano, HR 0.81 (0.6-1.08), p=.15
» PIOR morte total e hemorragia major - 5.9 vs 4.5 %/doente/ano, HR 1.31 (1.02-1.67), p=.03
2º » Igual morte cardiovascular | Igual AVC isquémico | Menor embolia sistémica (baixa taxa de eventos...)
» Iguais eventos adversos cardiovasculares major
» Igual mortalidade total | Pior hemorragia major
Comentário: Baam, outro apresentado na ESC 2023 (que anda um pouco mais calminha que anos anteriores recentes, parece-me). A meu ver, este é mais relevante que o apresentado anteriormente. Enquanto que o STEP-HFpEF apenas reforça utilização dum medicamento numa subpopulação, este ensaio responde a uma pergunta frequente e que continuava por responder. Em primeiro lugar, é importante ressalvar que o ensaio foi suspenso precocemente...mas por alarme de segurança! Uma controvérsia é se devemos suspender ensaios precocemente por eficácia, mesmo que pré-planeado. Agora, quando o motivo é segurança, parece-me que se justifica muito mais. Ainda assim, resultou num ensaio com 2.500 doentes (ou seja, grandinho) com follow-up de quase 2 anos (longuinho). Nada mau, diria. Quantos aos resultados, temos claramente mais hemorragia major, tendência não-confirmada para maior mortalidade total, um pouco menos embolia sistémica (com taxa de eventos baixíssima) e igual avc isquémico (com apenas 1% no total!!). Mas, dizem vós, se o ensaio continuasse, não seria possível que a menor embolia sistémica se exponenciasse e pudesse até culminar em menos AVC isquémico? Possível seria...mas igualmente possível e provável seria ainda mais hemorragia major e até a mortalidade total passar a ser uma tendência confirmada. Algo que ninguém quer. E para quem quer estudar tendências, olhe para as curvas Kaplan-Meier em baixo. Qual vos parece o caminho das tendências? Pois, cá para mim parece-me que a eficácia caminha para o lado da nulidade e a segurança sobe em rampa deslizante para o céu. E o que queremos menos, diria eu, é catapultar mais doentes lá para cima. Posto isto, mais um ensaio de "rastreio de actividade atrial" nulo. Que isto serve para assimilarmos que a anti-coagulação é muito importante mas não condição sine qua non para subsistência.
Conclusão: Iniciar anti-coagulação em doentes com pacemaker e eventos atrias aumentou mortalidade
n=862, ITT, sem ocultação, multicêntrico em 32 hospitais e 7 centros especializados no Reino Unido, 2018-2022
P - RCE após PCE extra-hospitalar + sem elevação ST
I - Transferência para 1 dos 7 centros "especializados em paragem cardíaca"
C - Habitual (transferência para hospital mais próximo)
O 1º » IGUALzinha mortalidade - 63 %
2º » Mais/iguais eventos adversos - 2 vs 1 %
Comentário: Depois de na semana passada vos ter trazido o ECLS-SHOCK, agora é a vez deste ARREST. Também oriundo da sempre frutífera ESC (2023 no caso), veio responder a uma pergunta pertinente e que não tinha resposta convincente...até agora. Se um doente sobrevivente de paragem cardiorespiratória extra-hospitalar não tiver elevação do segmento ST, não tem benefício em ser transferido para um centro longíquo "especializado em paragem cardíaca" (que, pelo que percebi, é igual a unidade de intensivos de cardiologia). Além disso, até parece que sofreu mais eventos adversos (numericamente apenas, é verdade, mas ainda assim...). É o terceiro "less is more" da ESC 2023, depois deste ensaio aqui em cima que acabei de comentar e do tal da semana passada. Acho que, quando juntamos este conceito ao "antiquado" de "bom senso", conseguimos mais ou menos prever as atitudes mais sensatas. Que usamos esta sensatez para a probilidade pré-ensaio de todos os outros actos que fazemos cuja resposta ainda não vimos respondida em ECA!
Conclusão: Em doentes sobreviventes de paragem cardiorespiratória extra-hospitalar sem elevação dos segmento ST, transferência para hospital com unidade especializada em intensivos com cardiologia não melhorou a mortalidade.
n=529, duplamente-oculto, multicêntrico em 96 centros e 13 países intecontinentais
P - Obesidade (IMC>30) + FEVE=>45% + NYHA II-IV + KCCQ-CSS<90 + TM6min>100M + 1 FR + Sem DM
FR: Pressão de enchimento ventricular elevada (medida directa) ou BNP elevado + anomalias eco ou hospitalizações por IC últ. ano + diuréticos ou anomalias eco
Pós-inclusão» ~69A | IMC~37 | P~105kg | FEVE~57% | NYHA ++II (66%) | KCCQ-CSS~60 | TM6min~320 | NTpBNP~450 | HospIC~15% | Diurético~80% | PCR~3.8mg/L
I - Semaglutido 2.4mg SC 1x/S por 52S » 0.25mg 1as 4S --> dose escalada 4-S --> obj. final de 2.4mg às 16S
C - Placebo "2.4mg" SC 1x/S por 52S
O 1º » MELHOR aumento no KCCQ-CSS » +16.6 vs +8.7 pontos, dif. de +7.8 pontos (IC 95% 4.8 a 10.9), p<.001
» MELHOR redução de peso » -13.3 vs -2.6 %, dif. de -10.7% (IC 95% -11.9 a -9.4), P<0.001
2º » Melhor aumento no TM6min » +21.5 vs +1.2 metros, dif. de +20.3 metros (IC 95% -11.9 a -9.4), p<.001
» Melhor desfecho composto hierárquico (MT + HospIC ou SUIC c/ diurético EV + KCCQ-CSS + TM6min) - WR 1.72, p<.001
» Melhor... redução de PCR » -43.5 vs –7.3 %, eTR 0.61, p<.001
» Menos EA Graves » 13.3 vs 26.7 %, RRA 13.4% / NNT 7.5 » menos doenças cardíacas, respiratórias e infecções
Comentário: Antes que tudo, um enquadramento fundamental. A meu ver, este ensaio é um “ensaio com semaglutido em doentes obesos que também têm ICFEp ligeira”, a maioria deles hipertensão e metade c/ FA. Espero que não seja citado como um “ensaio de semaglutido em doentes com ICFEp que também têm obesidade”. Mesmo que não pareça, este detalhe faz uma enorme e enganadora diferença na forma de pensar sobre este medicamento, abrindo portas ao marketing excessivo e até abusivo, tanto nas orientações como na prática. Comentando então os resultados:
- Os resultados não foram globalmente impressionantes. Perda de 10% de peso num ano...não gosto de citar evidência empírica, mas, como exemplo, o meu pai perdeu recentemente 30kg apenas com (sobretudo) dieta e (algum) exercício. O pequeno ganho no KCCQ-CSS (7.8 pontos numa escala de 0 a 100) e no TM6min (20 metros) foi marginal e, na verdade, concordante com a perda marginal de peso.
- Os resultados mais positivos, para mim, vislumbram-se nos eventos adversos graves! O semaglutido obteve uma RRA de 13.4% / NNT 7.5, com menos eventos adversos cardíacos, respiratórios e infecciosos. O ensaio não foi grande e nem suficientemente empoderado para isso, mas, entre tudo, foi o que mais me interessou. Sem este resultado não seria quase nada impressionante.
- No final das contas, os resultados não mudarão muito a minha prática. Já utilizo GLP1a em pacientes com obesidade, principalmente se houver fatores de risco (principalmente cardiovasculares) e com dificuldades em intervenções no estilo de vida. Talvez fique mais convencido que o sema não aumentará os efeitos adversos graves, muito pelo contrário, mas continua apenas uma hipótese que precisa de maior e melhor confirmação.
- Finalmente, espero que não resulte em aumento da "indication creep", em que mais doentes com ICFEp sem obesidade / obesidade borderline e sem diabetes acabem com prescrições de semaglutido só porque sim.
Conclusão: Semaglutido 2.4mg SC durante cerca de um ano em doentes com obesidade e ICFEp ligeira resultou em melhoria ligeira no peso, score KCCQ-CSS e outros, sem aumentar (até diminuindo) os efeitos adversos graves.
Geral, Geriatria & Paliativos
n=10802, pragmático, stepped wedge cluster (aglomeração escalonada), multicêntrico em 14 unidades dos EUA, 21-22
P - Adultos >65A
I - Vídeos sobre Objectivo de Cuidados em 29 línguas e sintéticos por "educadores de cuidados paliativos" (enfermeiros e assistentes sociais)
C - Cuidados habituais
O 1º » MAIOR documentação de OdC - 62 vs 50 %, p<.001
Comentário: Se há bem pouco tempo conhecemos o PICSI-H, o ensaio que nos mostrou que uma estratégia de educação/alerta no sistema electrónico hospitalar aumentou a documentação de objectivo de cuidados (OdC), agora ficámos a conhecer que vídeos sucintos também o fazem. No 1º, esse aumento foi ténue mas existente, com diferença de 30 para 34 %. Neste caso, vimos um aumento bastante mais significativo de 50 para 64 %. Podemos teorizar porque i) tivemos muito mais registo de OdC no grupo de controlo e ii) muito maior eficácica neste ensaio, mas a minha interpretação mais simplista é a de que insistirmos nos objectivos de cuidados cumpre o objectivo em si mesmo.
Conclusão: Vídeos sobre objectivo de cuidados aumentaram a sua documentação por doentes e/ou cuidadores.
Imuno-mediadas
n=123 (de 157), duplamente-oculto, multicêntrico em 60 hospitais de 20 países, 2020-2022, Indústria (Boehringer)
P - Psoríase pustular generalizada (PPG) por critérios ERSPEN + =>2 flares + GPP PGA 0-1
GGP ERSPEN: Pústula primária, estéril e macroscopicamente visível na pele não-acral (excluindo pustulação estrita a placas psoriáticas) +- SIRS +- P.vulgaris
GGP Physician global assessment (0-4): 0 = Pústulas não-visíveis | 1 = Pústulas pequenas, ocasionais e não-coalescentes de baixa-densidade
I1 - Spesolimab baixa-dose SC 300mg de carga + 150mg 12/12S por 48S
I2 - Spesolimab média-dose SC 600mg de carga + 300mg 12/12S por 48S
I3 - Spesolimab alta-dose SC 600mg de carga + 300mg 4/4S por 48S
Spesolimab: Inibidor do receptor da interleucina-36
C - Placebo SC
O 1º » Não-flat curva dose-resposta » % de flares de 23% c/ I1, 29% c/ I2, 10% c/ I3 e 52% c/ C
» MAIOR tempo até 1º flare » HR 0.16 (0.05–0.54), p=0·0005
2º » Iguais infecções | Sem mortes ou reacções de hipersensibilidade
Comentário: O Lancet "não me deixa" (deixaria, mas a pagar bem...) ver mais informação que esta, pelo que esta análise será bastante incompleta e redutora. No entanto, há já coisas que consigo dizer. Primeiro, bom, ensaio controlado e aleatorizado com ocultação-dupla positivo para o desfecho primário. Disso ninguém duvida. Mas com muitas nuances...começando pela população, trata-se de um grupo de doentes com exacerbações mas com doença bastante bem-controlada, pelo que consigo perceber da inclusão apenas de doentes com GPP PGA 0-1 (não consigo ver a tabela das características basais para confirmar). Depois, ensaio bastante pequeno. O número de ~130 engana, porque, na verdade, distribuído em 4 grupos dá ~30 doentes por grupo, o que é muito pouco. O desfecho primário também é meio estranho, nunca tinha visto esta "curva dose-resposta não-flat" como desfecho primário, não sei bem o que significa e fico com dúvidas que seja sequer para percebermos. Por último, o habitual nestes ensaios de doenças imuno-imediadas: mais um tratamento comparado com placebo entre muitos outros, e ficamos sempre dependentes de comparações indirectas para perceber qual o melhor tratamento. Neste caso, fazendo um rápido vislumbre do arsenal terapêutico de que o UpToDate dispõem, vemos que não fica nada fácil saber que tratamento escolher. E, já agora, fico com a ideia que, antes de tratamentos mais "especiais", tratamos a PPG não-grave com retinóides orais e metotrexato...estarei enganado? Estou aberto a receber mais informação, sugestões ou interpretações.
Conclusão: Spesolimab, inibidor Il-36, parece superior a placebo na psoríase pustulosa generalizada com exacerbações mas sem actividade grave.
NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICAS - GUIDELINES
Geral, Geriatria & Paliativos
É verdade, vêm aí (ou já chegaram) as duas novas vacinas contra o Herpes Zoster. Espreitem os ensaios e os estudos, leiam as recomendações e tirem as vossas conclusões. Em primeiro lugar, pena que as recomendações não se baseiam em revisões sistemáticas ou em guidelines de elaboração e divulgação de normas, como GRACE e AGREE. Em relação à vacina, parece, por um lado, levam a uma enorme redução de herpes zoster e até de neuralgia pós-herpética. E há uma revisão sistemática da Cochrane recente sobre o tema (porque não é mencionada??). Por outro, incerto se reduzem a doença grave. Por último, sem desconfiança directa, seria mais transparente uma recomendação feita sem ligações à indústria (à própria que comercializa uma das duas vacinas). O que fica a achar disto tudo? Até acho lícito vacinar para evitar uma dor chata, isto sabendo que as vacinas não levaram a mais eventos adversos graves (mais no geral, "apenas")...mas também reconheço que não parecem ser vacinas "milagrosas".
2 ECAs da vacina recombinante: ZOE-50 e ZOE-70 | 2 ECAs da vacina viva atenuada: SPS e ZEST (apenas adultos =>50 anos sem imunossupressão)
ESTUDOS OBSERVACIONAIS
REVISÕES SISTEMÁTICAS COM ESTUDOS OBSERVACIONAIS (com ou sem ECA)
Diagnóstico e Raciocínio Clínico
Ultrasound for the diagnosis of peritonsillar abscess: A systematic review and meta-analysis | Acad Emerg Med
n=17 estudos / 812 doentes, PRISMA-DTA, QUADAS-2, 1960-2022
Desta extensa revisão sobre diagnóstico ecográfico de abcesso amigdalino, resultou que o POCUS tem uma boa sensibilidade e uma especificidade satisfatória, independemente se intraoral ou transcervical (curiosamente, parece que a via transcervical foi mais específica...). Dá uma certa segurança para pôr a sonda naqueles doentes com amigdalite persistente ou mais grave em que ficamos na dúvida. Com uma elevada percentagem e consequente elevada probabilidade pré-teste (neste revisão foi 67%), até conseguimos quase confirmar e excluir com estes bons likelihood ratios. Mas teremos de usar muitas vezes a TC para confirmar, até porque tenho muitas dúvidas de que essa percentagem seja real e não o resultado de um enorme viés de selecção.
Cuirado com as limitações óbvias de estudo observacional, com viés de selecção evidente que se nota pelo baixo rácio doente/estudo (812/17estudos=48/estudo).
Meta-investigação & MBE
n=200 estudos (84% >2020), Medline/Embase/PsycINFO/WebofScience, 2012-2022
Ah e tal, simular ensaios é muito bonito, mas convém que seja feito de forma explícita e com algum rigor. Mais de metade não reportou no protocolo de forma explícita a "emulação", quase metade não descreveu todos os itens, só 1/3 fez uma simulação de ensaio explícita e apenas 1/4 usou uma guideline metodológica (como SROSE). Mais um factor para adensar a discussão, muito na moda depois do RCT-DUPLICATE.
PRIMÁRIOS - SUB-ANÁLISE / COORTE / CASO-CONTROLO / INQUÉRITOS / A. ECONÓMICAS
Imuno-mediadas
n=5.931, coorte populacional retrospectiva do Reino Unido (cuidados primários), 2013-2022
No mês passado já fora publicado no AIM um estudo muito parecido (mas com acréscimo de usar propensity score) que por cá andou. Agora, este com a mesma ideia, comparar as exacerbações de gota em novos iniciadores de iSGLT2 vs novos iniciadores iDPPIV e aGLP1. Mais uma vezes, esse risco parece reduzir. Muito boa hipótese, mas volto a dizer que precisamos de um ECA nesta população específica (doentes com gota sem diabetes) para que possa eventualmente alterar a nossa prática. Por quanto, quando muito, pode nos ajudar na escolha entre iSGLT2 ou aGLP1, mas ainda assim eu não estaria tão certo em usar isto como argumento definitivo para iSGLT2.
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
n=208.061 / 1.037.423, estudo retrospectivo de Veteranos dos EUA, comparação emparelhada, 2021-2023
Parece que, ao fim de 2 anos, a mortalidade total de sobreviventes de COVID-19 é igual quando há emparelhamento tendo em conta o risco basal. Hmm, estranho...a imunidade afinal sempre funciona? Afinal o COVID19 não origina nenuma espécie de doença crónica específica, assim como nenhum outro vírus do género? Okay.
CASOS CLÍNICOS e SÉRIES DE CASOS
Dermatologia
Forma mais grave e disseminada de pitiríase rósea / rosada chamada de "persistente". O tratamento é apenas "suporte e esperar", mas reconhecê-la é importante.
Gastroenterologia & Hepatologia
Icterícia obstrutiva por divertículo peri-ampola de Vater.
Imuno-mediadas
Pneumonia intersticial linfóide e tiroidite de Hashimoto? Hmm, okay.
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Estrongilodiase disseminada em doente imunocomprometido diagnosticada em broncofibroscopia? Não se o caso poderia ter sido abordade de forma diferente, mas deixa-me a pensar.
OPINIÃO
REVISÃO NARRATIVA
Dermatologia
PERSPECTIVA
Geral, Geriatria & Paliativos
Eu sou um fã confesso #MedEd. Quando há uns anos eu e os meus amigos esFOAMeados decidimos escrever uma perspectiva sobre a FOAMed que foi publicada na Acta Médica Portuguesa, argumentámos as vantagens desta via. Nem tudo é um mar de rosas, verdade. Mas é certo que faz parte da sociedade. Fazendo parte, temos de lidar com a MedEd e a FOAM com a devida atenção que merecem,
Oncologia
The Future of Cancer Screening—Guided Without Conflicts of Interest | JAMA
Se o rastreio não diminui a mortalidade...afinal para que serve? Ganhar dias de qualidade? E ganhamos mesmo dias de qualidade? O que fazer? E porque é que prova científica ignorada da comunidade médica e até das guidelines, ou porque são certas guidelines ignoradas da comunidade? Leiam.
NOTÍCIAS
Neurologia
Cuidado. Antipsicóticos aumentam a mortalidade na demência.
ABA - Aumento de Benefício Absoluto | ARA - Aumento de Risco Absoluto | EBM - Evidence-based medicine | ECA - Ensaio controlado e aleatorizado | ITT - Intention-to-treat Analysis | MA - Meta-análise | MBE - Medicina baseada na evidência | NIT - Non-inferiority trial | NNH - Number needed to harm | NNT - Number needed to treat | PPA - Per protocol analysis | RR - Redução Relativa | RRA - Redução do Risco Absoluto | RS - Revisão Sistemática
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