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Bernardo Vidal Pimentel

Maio de 2023 - #2 Semana em semana, afino a situação

Atualizado: 16 de mai. de 2023



No substack: esFOAMeados


TABELA DE CONTEÚDOS

 

SINOPSE


🎂 Nata da nata

- Osteoporose --> Qual o melhor fármaco? Tem nuances.

- Lavar as mãos --> Reduz infecções em países de rendimento baixo/moderado


🍰 Nata

- Prótese aórtica mecânica On-X --> Esquece o NOAC, nem aqui

- Entubação no trauma --> Sequência rápida atrasada (DSI) > Sequência rápida normal (RSI)

- Insulina e DM2 --> Semanal (icodec) não-inferior a Diária muito-longa (degludec)

- Infecção por Hpylori --> Vonoprazan/amoxicilina não-inferior a terapia quádrupula com bismuto

- Lombalgia crónica --> Terapia cognitivo-funcional eficaz mas sensor de biofeedback desnecessário

- Comunicação médico/doente --> Folheto com FAQs não melhorou a maioria das escalas, mas pode melhor a percepção global e foi preferido pelos doentes

- Alta hospitalar --> Intervenção com "trabalho orientado para a alta" não a aumentou

- Descolonização SA --> Reduziu dermatite da radiação aguda na neoplasia da mama/pescoço/face


🧐 Observações

- Revisões sistemáticas: Novidades de 2022 na medicina peri-operatória (spoiler: evita gabapentinóides)

- Primários: BB há >1 ano após EAM | NSTEMI com equivalentes STEMI e angiografia imediata | Lesão hepática hemorrágica e angioembolização | ChatGPT vs AskDoc (Reddit) | Meningites virais (sintomas, principais agentes e antivirais) | Colonização por SA e dermatite de radiação aguda | PCR point-of-care e impacto na prescrição e diagnóstico | Laringoscopia directa e tamanho de lâmina macintosh

- Casos e séries: Dor no punho e diagnóstico diferencial (com ajuda preciosa)


Opiniões

- Perspectiva: Vacina anti-RSV aprovada pela EAM


🌎FOAMed

- Paracetamol e HTA | Conselhos para internos | ACP 2023 | Rituximab vs azatioprina na manutenção de vasculite-ANCA | Insuficiência respiratória, gasimetrias arteriais, venosas e oximetria (spoiler: gasimetria out!) | PET-TC vs TC na febre de origem indeterminada | Nova aplicação de técnicas de emergência: exemplo da punção lombar com boas dicas.

 

REVISÕES SISTEMÁTICAS de ECAs

Geral, Geriatria & Paliativos

69 ECAs / n>80.000 patients, Medline / Embase / Cochrane, 1996-2021

P - Mulheres pós-menopausa não-asiáticas (estudos que mediraram desfechos ósseos)

I - Tratamento de osteoporose

C - Comparador activo ou placebo

Fármacos anabólicos --> Romosozumab e Agonistas de receptores de PTH | Fármacos anti-reabsorptivos --> Bifosfonatos e Denosumab

O 1º » MENOS fracturas clínicas com fármacos anabólicos vs bifosfonatos e denosumab

- Anti-reabsorptivos com menos eficácia quanto maior idade

» IGUAIS/MENOS fracturas clínicas com bifosfonatos vs denosumab

2º » Menos fracturas totais com todos

» Menos fracturas vertebrais com anabólicos e denosumab vs bifosfonatos

» Iguais fracturas da anca no geral (talvez mais c/ moduladores dos estrogéneos)

» Iguais fracturas osteoporóticas major

» Iguais EAs gerais (talvez menos c/ bifosfonatos) e CV

» Igual mortalidade (talvez menos se bifosfonatos vs denosumab)

Comentário: Difícil de comentar esta RS/MA...teria de fazer uma análise profunda da literatura, ver quais os ECAs de melhor qualidade e maior amostra, etc para uma análise rigorosa. Como não o fiz, terei de confiar parcialmente, o que costumo fazer nestes casos. Resumindo, no geral acho que qualquer um serve para reduzir todas as fracturas. Priveligiando reduzir fracturas clínicas, os anabólicos levam a taça (o desfecho que mais deveria interessar, mas em tanto ensaio aposto que foi definido de forma muito heterogénea). Priveligiando a segurança, os bifosfonatos levam a taça. Priveligiando a longevidade, o denosumab desce para a 2ª-liga. Acho que a coisa que consigo dizer com mais confiança com "é abandonar denosumab"? Deixo-vos com o resumo das novas normas da ACP que fiz lá no mês longíquo de Janeiro.

(não difere muito das conclusões gerais desta revisão dos ensaios)

Conclusão: Muitas nuances no tratamento da osteoporose. No geral, pode não ser muito diferente usar um ou outro em termos de eficácia e segurança, mas caso a caso.


Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos

26 estudos (20 ECAs | 13 Ásia, 9 África e 3 América Latina) / n=161.659 (), várias bases de dados, 2002-2017

P - Países de baixo- ou médio-rendimento + domicílio ou escola

I - Lavar as mãos (com ou sem sabão)

C - Habitual

O - MENOS infecções respiratórias agudas - RR 0.83 (IC 95% 0.76–0.90), I2 88%, Egger p=0.45, certeza moderada

- Redução nos subgrupos de infecções respiratórias altas, baixas e influenza (menor heterogeneidade para baixas)

- Redução nos subgrupos de escolas e domicílio

- Redução da mesma magnitude na análise restrita aos ECAs

Comentário: Isto é um estudo sobretudo dirigido a uma população de crianças, mas não só (também inclui domicílio). Nada que surpreenda, mas bom saber que lavar as mãos reduz as infecções respiratórias agudas, tanto altas, como baixas, como por influenza. A famosa RS A122 já tinha chegado a conclusões semelhantes, mas como sofreu tantas (na minha opinião, injustas) críticas, fica aqui outra revisão feita por outros autores a apontar para a mesma direcção.

Conclusão: Lava essas mãos, filho!


ENSAIOS CONTROLADOS E ALEATORIZADOS

Cardiovascular

Mais uma vez, NOAC "não não-inferior" (simplificando mas tecnicamente errado, inferior) à varfarina após implantação de válvula mecânica, até se usando estas válvulas mecânicas "On-X" com menor risco trombótico.


Doente crítico/urgente

n=200, SU de centro académico com trauma, Índia

P - Doente crítico no SU c/ necessidade de IOT

I - Entubação sequencial atrasada (DSI) - Bólus de cetamina 0.5mg/kg até dissociação » pré-oxigenação por 3min » sucinilcolina

C - Entubação sequencial rápida (RSI) - Pré-oxigenação por 3min » Cetamina »rapidamente» Sucinilcolina

O 1º » MENOR hipóxia peri-intubação - 8 vs 35 % (p=0.001)

2º » MAIOR sucesso na 1ª-passagem - 83 vs 69 % (p=0.02)

Comentário: Na minha prática de SU, não vejo doentes de trauma. Pergunto-me se já fará parte da intubação padrão a utilização de cetamina como indutor. Caso não faça, estamos longe desta realidade e ainda mais longe da realidade inovadora de DSI, disseminada em parte pelo EMCrit. Faz-me sentido teórico estabilizar primeiro os doentes com um indutor não depressor respiratório ou cardiovascular (e com algum sinal de melhoria na fisiologia pulmonar, segundo o pouco que sei do assunto). Pelos vistos, foi isso que aconteceu: os desfechos em ECA parecem bastante bons. Melhor, inicialmente pensada para doentes agitados, foi até bem melhor em todos os doentes pós-trauma! A boa-nova surpreendeu o próprio evangelista, se ouviram o excelente RACC-EMCrit do mês passado.

Conclusão: EOT sequencial "rápida atrasada" com maior sucesso de 1ª-passagem que "sequência rápida imediata" no doente crítico pós-trauma


Endocrinologia

n=526 (635 rastreados), NIT, não-oculto, multicêntrico em 71 centros de 9 países, 2021

P - Adultos com insulina basal qd ou bid +/- ADO (HbA1C basal ~ 8%)

I - Insulina icodec (1x / semana)

C - Insulina degludec (1x / dia)

O 1º » NÃO-INFERIOR redução de HbA1C após 26S » -0.97% vs -0.68%

2º » Não-inferior variação de peso (quase inalterado em ambos, mas ligeiro aumento com icodec)

» Não-inferiores EAs (ligeiro aumento numérico com icodec mas sem significância estatística)

Comentário: Se era não-inferioridade que se queria demonstrar, acho que está bem demonstrada. Parece-me válida a ideia do ECA de não-inferioridade, já que uma administração de insulina semanal tem uma vantagem intrínsica óbvia. Pergunto-me há algum tempo porque não estamos a usar mais insulina icodec, e este ensaio reforça essa pergunta. Talvez num futuro (não tão próximo) com semaglutide, terzepatide, iSGLT2 e outros que tais nem sequer estaremos a usar insulina na maioria dos casos...mas, usando, icodec parece-me a escolha!

Conclusão: Insulina icodec (semanal) não-inferior a degludec (diária) em adultos com DM2 não muito controlada


Gastroenterologia & Hepatologia

ensaio controlado e aleatorizado de não-inferioridade, resto?, China

P - Infecção por Helicobacter pylori = ?

I1 - Vonoprazan + Amoxicilina dose-elevada 20mg bid / 750mg qid

I2 - Vonoprazan + Amoxicilina 20mg qd / 1g bid

C - TTO Quádrupulo com bismuto (esomeprazole 20mg + bismuth 200mg + amoxicillin 1g + claritromicina 500mg bid)

Vonoprazan: Inibidor da H/K-ATPase

O 1º (APP) » Taxa de erradicação não-inferior com I1 (e numericamente superior) - 93.4 vs 85.1 vs 90.9 %

O 1º (ITT) » Taxa de erradicação não-inferior com I1 (e numericamente superior) - 91.2 vs 82.4 vs 88 %

Comentário: Este ensaio já tinha sido publicado electronicamente em Janeiro e foi publicado oficialmente em Abril, mas só agora me deparei com ele. Demasiado bom para acreditar? Não consigo fazer uma análise consistente porque só consigo aceder ao resumo. A minha mente cepticamente direccionada para a hipótese nula faz-me questionar os resultados e pedir por validação externa, multicêntrica e internacional antes de grande entusiasmo. Por outro lado, a minha também iluminadamente direccionada para a boa-nova mente faz-me querer acreditar nestes resultados. Por enquanto, aguardarei com o meu umbigo a encarar os botões.


Geral, Geriatria & Paliativos

n=492 (rastreio de 1.011), não-oculto, 20 clínicas de fisioterapia de CP na Austrália, 2018-2020

P - Adultos + Dor lombar >3M + Limitação mod/grave + (s/ patologia grave da coluna) + (s/ cx próximos 3M)

I1 - Terapia cognitivo-funcional (~TCC)

I2 - Terapia cognitivo-funcional + sensor de biofeedback

C - Habitual

O 1º » MENOR limitação de act. física após 13 semanas » I1 -4.6 (IC 95% -5.9 a -3.4) | I2 -4.6 (-5.8 a -3.3)

2º » Menor limitação após 52 semanas

» Melhor QALY e menos custos directos e indirectos

Comentário: Não consigo abrir o artigo para ver a tabela dos factores basais, mas tenho alguma desconfiança de população seleccionada num ensaio em que se incluiram inicialmente 1000 adultos e no final sobraram apenas metade depois de exclusões. Outra coisa que aponto é que o sensor não parece estar a fazer nada. Não acho que os autores tenham reforçado este último ponto com convicção, mas nada que seja incomum.

Conclusão: Terapia cognitivo funcional melhora a actividade física de doentes com limitação moderada a grave por dor lombar crónica.


n=130, ITT, clínica de cuidados paliativos e continuados de um centro oncológico dos EUA (Texas), 2017-2019

P - Doentes com neoplasia na 1ª consulta de cuidados paliativos

I - Folheto informativo com "25 questões habituais de doentes" (espécie de FAQ)

C - Folheto informativo habitual

O 1º » IGUAL percepção dos doentes como auxiliador - 7/10 pontos em ambos

2º » Maioria dos desfechos iguais

» Melhor escala de percepção global - 7.1 vs 6.5 (0/10)

» Maior preferência de utilização dos doentes após 4 semanas - 24 vs 7 %

Comentário: Para muitos, este é mais um estudo fútil e inútil. Mas eu gosto muito destes estudos qualitativos e acho-os muito relevantes. Acho a pergunta e intervenção relevantes, pois melhorar a comunicação entre médico e doente, sobretudo nesta população, é fundamental. Por outro lado, todos sabemos que estes estudos avaliam coisas difíceis de medir com desfechos subjectivos, pelo que a minha expectativa antes de ler este tipo de estudos nunca é muito elevada (numa nota pessoal, na verdade, tento nunca gerar grandes expectativas, sobretudo agora enquanto leio o livro do Dickens). Passando a baixa expectativa, declaro que não é um ensaio totalmente modificador de prática, já que foi negativo para o desfecho primário e maioria dos secundários, além de ser de um centro único e ter uma amostra pequena. No entanto, parece-me que não custa muito mais fazer um folheto com questões que um folheto explicativo normal (talvez até menos pela maior objectividade). E se, pelo menos, parece melhorar algo (e coisas relevantes, como percepção global e preferência) sem aparentes efeitos adversos, diria que suporta o seu uso. Para finalizar, tem a vantagem de ser sido feita ocultação (não escondo, com dúvidas se foi bem sucedida...)!

Conclusão: Folheto com "FAQs" não foi muito diferente de folheto habitual na comunicação entre doente com neoplasia e médico paliativista na 1ª consulta, mas parece melhorar a percepção global e ser preferido pelos doentes.


n=4437 doentes / 59 médicos, 3 hospitais terciários de grandes dimensões, EUA (Colorado e Maryland), 2021

Imaginem que trabalham ou até lideram três hospitais grandes. Imaginem que confiam na vossa equipa e acham que todos fazem o melhor para dar alta aos doentes o mais cedo possível. Acham que um ensaio em que aleatorizassem metade dos médicos para um grupo onde se insiste em alta precoce mudaria algo? Eu diria à partida que não. E foi o mesmo o que aconteceu com este ECA. Não fico nada surpreendido. Acho a ideia boa e original, pois, pelo menos, é uma ideia minha não testada previamente que fica comprovada em ensaio, mas não me espanta. Talvez haja outra forma (que não sei qual) de separar melhor os dois braços. Para o país de onde vem o ensaio, isto tem uma especial relevância pois é utilizada frequentemente a estranha métrica de qualidade "alta antes do meio-dia" (porque ir para casa às 12h30 não dá jeito nenhum........). Por enquanto, foquemo-nos em ser bons médicos!

Conclusão: Insistir e relembrar os médicos para dar alta precocemente não diminuiu o tempo de estadia nem melhorou nenhum dos desfechos secundários como tempo de estadia.


Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos

n=77 (80 aleatorizados, 123 rastreados), não-oculto (apenas investigador), centro único nos EUA (NY), 2019-2021

P - Neoplasia mama / face e pescoço + Indicação para RT curativa

I - Descolonização de SA mupirocina IN bid e clorexidina corporal qd por 5d » repetido 2/2S durante o tempo de RT

C - Habitual

O 1º » MENOS dermatite de radiação aguda grau =>2 (descamação húmida) - 0 vs 45.3 %

2º » Menos colonização com SA

» I - Aderência moderada (70%) e 1 doente (2.5%) com EA (prurido)

Comentário: Sim, não é um ECA com nada de muito especial, mas, ainda assim, o desfecho primário tem a sua relevância clínica. Menos dermatites é uma coisa boa, diria. Tendo em conta a intervenção escolhida (isto porque havia um sinal de que colonização de SA fosse um FR para a dermatite de radiação aguda), fico na dúvida como seria se tivessem estudado a diferença entre os doentes com e sem colonização de SA. Também está muito limitado pelo reduzido tamanho amostral, perda de doentes e não-ocultação. Tem os pontos fortes da (pelo menos "semi") objectividade do desfecho primário e da ocultação dos investigadores.

Conclusão: Descolonização de SA em doentes com neoplasia da mama, face ou pescoço que fizeram RT reduziu dermatite de radiação aguda



ESTUDOS OBSERVACIONAIS

REVISÕES SISTEMÁTICAS COM ESTUDOS OBSERVACIONAIS (com ou sem ECA)

Cirurgia, Ortopedia & MFR

Meta-revisão com RS/MA e estudos primários, multi-base-de-dados, Delphi modificado, 2022

Algumas conclusões do que temos vindo saber daqui resultaram, das quais destaco com comentários:

  • EVITAR gabapentinóides no peri-operatório » risco de delirium, uso de anti-psicóticos e pneumonia

    • Para mim este é o principal. Eu diria que não só no campo peri-operatório, mas evitar sempre que possível (vários estudos o suportam, mas, pelo menos em PT, ainda são muito usados)

  • FA pós-operatória com desfechos semelhantes a pré-operatória

    • Tenho pensamentos ambivalentes com esta declaração. Por um lado, parece ser verdade, por outro, que eu saiba, também não há prova que esta FA se converta em risco de em FA futura ou até permanente e, sobretudo, de que tratá-la com anticoagulantes seja benéfico. Poderá aumentar anticoagulação neste grupo sem termos ainda um ECA a demonstrar que tal seja bom para os doentes.

  • HBPM superior a AAS para reduzir TVP sintomática

    • Pensamentos ambivalentes de novo. Apenas reduziu TVP sintomática sem reduzir TVP acima do joelho (potencialmente mais grave) ou TEP. Também há a limitação que muitos no braço "HBPM" também estavam a fazer AAS e que o ECA foi suspenso precocemente. Talvez NOAC seja o ideal (que nem sequer foi o recomendado...), mas não ficaria chocado com AAS.

  • AVC afecta risco sobretudo nos 1os 30d, quase sem afectar após 60-90d

    • Relevante. Muitas recomendações adiam a cirurgia para 6 meses depois de AVC, mas, pelos vistos, adiar 1-3 meses depois não parece ser desajuizado.

  • Sem benefício de VNI pós-OP profiláctica em doentes de risco para complicações pulmonares

    • Não sabia que isto era um tema. Talvez não tenho sido mau ter permanecido na escuridão, neste caso.


PRIMÁRIOS - SUB-ANÁLISE / COORTE / CASO-CONTROLO / INQUÉRITOS / A. ECONÓMICAS

Cardiovascular

n=43.618, coorte de representação nacional (registo nacional de doença coronária), Suécia, 2005-2016

Nesta coorte gigante de doentes com EAM e BB com exclusão dos com IC e disfunção do VE, os desfechos dos doentes com BB além do 1º ano (80% dos doentes) não foram diferentes dos sem BB (20%). Apoia a tendência actual para questionar o benefício dos BB numa era pós-ICP. Sim, observacional e com números bastante desequilibrados. Só conseguimos dizer que, no subgrupo minoritário de doentes seleccionados, a descontinuação de BB após 1 ano não foi uma má jogada. Pelos vistos, há pelo menos 5 ECAs a decorrer que estudam o assunto, pelo que aguardaremos!


Doente crítico/urgente

n=143, estudo retrospectivo de registo, multicêntrico no Japão, 2012-2017

Estudo relevante. Sabemos actualmente que coronografia emergente não é benéfica (e até potencialmente maléfica) nos doentes com PCR e NSTEMI. Estes autores quiseram estudar "e se tiverem equivalentes NSTEMI?". Pegaram num base de dados de vários hospitais japoneses e seleccionaram os adultos com PCR-EH não-traumática, FV ou AESP, e foram ver se os equivalentes STEMI dos ECGs aumentariam a acuidade diagnóstica de SCA. Chegaram à conclusão que inversão isolada de onda T e ondas T de Winter têm elevada especificidade mas não boa razão de verosimilhança (LR+ 0.89-1.89). Muitas limitações, mas boa ideia de estudo. Tenho dúvidas sobretudo na amostra pequeníssima num registo de 5 anos dum país nada pequeno, o que me levanta algumas suspeitas de viés de selecção. Para um próximo estudo gostaria de saber: e doentes com anomalias segmentares em POCUS/ETT?


n=192, coorte prospectivo e multicêntrica em 22 centros de trauma (EUA e Israel)

Neste doente que incluiu os doentes com lesão hepática hemorrágica que fizeram TC <2h após admissão, a estratégia conservadora associou-se a melhores desfechos que a estratégia interventiva com angioembolização.


Geral, Geriatria & Paliativos

n=195, estudo transversal de amostra aleatória de fórum digital (AskDocs do Reddit), 2022

Não vou falar muito deste estudo além do que já foi tão debatido por pessoas tão mais inteligentes, experientes e rigorosas que eu, mas como isto é mais para divulgação que análise rigorosa (espero que com o mínimo de rigor, atenção!), tomem lá disto. Neste estudo original foram comparadas respostas de médicos voluntários do portal AskDocs com respostas originadas pelo dispensador de apresentações Chat GPT, onde os doentes não sabiam quem tinha formulado a resposta. Este chat não só não foi inferior como até foi bastante superior, na verdade em 80% dos casos! Confesso que gostei muito do estudo, achei-o bastante original. No entanto, com o tudo neste mundo global, gerou muita crítica indignada por este mundo fora. Acho que parte das críticas são injustas pela principal razão de que isto é um estudo que compara "respostas de médicos na internet" com "respostas de chat na internet". Ponto. Muita gente parece achar que o comparador foi o médico na clínica ou no hospital. Cá para mim, se há a possibilidade de haver um chat virtual melhor que o médico virtual, venha o chat. No futuro, por certo que virão novos estudos no tema, provavelmente mais e mais virados para comparação com real prática médica. E cá estaremos nós para os ler!


Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos

n=1.066, coorte prospectiva de base populacional, Dinamarca (grupo de estudos de infecções cerebrais)

Neste estudo de amostra nada mínima, há várias coisas interessantes das quais destaco:

  • Maioria do agente identificado foi enterovírus (40%) e em grande parte nenhum identificado (30%)

  • Herpes virus simplex 2 e varicella zoster em 30% e o uso de antivirais não parece ter tido contributo significativo de melhoria

  • Idade média de 33 anos, equivalente entre homens e mulheres (mas mulheres com maior gravidade!)

  • Tríade "cefaleia + rigidez nucal + hiperacúsia/fotofobia" em apenas 30%

  • CEFALEIA em praticamente todos (95%) e febre e hiperacúsia/fotofobia na grande maioria (71% e 67%), mas não todos...

Interessante e importante para nos ajudar a construir um raciocíonio diagnóstico mais estruturado!


n=76, estudo de coorte, neoplasia mama/pescoço/face a fazer RT, EUA (Nova Iorque)

Estudo dos mesmos autores que o ECA mencionado acima e que serve para suportar o conceito que colonização por SA aumenta o risco de dermatite de radiação aguda, alcançando associação positiva para esse factor de risco.


Técnicas, POCUS, Exames & Outros

n=112 questionários / 18 médicos, estudo transversal, SU em "fora-de-horas", Alemanha (Hildesheim), 2021-2022

Achei este estudo à base de questionário fascinante. Sim, calma, é um estudo transversal e sem ocultação, com muitos viés possíveis. No entanto, parece-me haver sempre uma certa beleza quando estudamos de que forma a recepção de informação clínica altera de facto o diagnóstico e/ou a intervenção. Neste caso, alterou em 83% dos casos! Qual o maior potencial problema, diria eu? Temos de confiar na prática destes médicos. Médicos alemães não me parecem ser piores que a média (vivi na Alemanha durante 1 ano onde fiz o 3º ano da faculdade pelo que posso estar enviesado). Por outro lado, na mudança de decisões relacionadas com tratamento antimicrobiano (13%), em >3/4 dos casos foi para descalar tratamento, o que me parece a grande mais-valia deste estudo. Poderá estar relacionado com a maior confiança diagnóstica (95% dos casos) com que estes médicos ficaram. Quem seja um Jedi do diagnóstico infeccioso, caso tal exista, talvez não precise de PCR (conheço algumas lendas do #IDtwitter que dizem que esta não serve para grande coisa, talves esses...). Sim, estudo limitado pois não sabemos bem se essa redução, de facto, aconteceu, e aplicabilidade poderá estar limitado aos SU fora-de-horas sem recurso a laboratório e radiologia. Na minha prática, acho que a PCR ajuda. Sobretudo para convencer outros médicos da não necessidade de antibiótico. Citando Brad Spellberg, o antibiótico é o ansiolítico do médico. Esse é uma das lendas que não confia na PCR. Mas será a PCR uma espécia de profilaxia ansiolítica?


n=592, estudo retrospectivo de entubações no SU e UCI, propensity score, EUA

Mais um estudo a associar lâmina Macintosh 3 a melhor desfechos que Mac 4, depois de no ano passado o MacSize-ICU ter chegado à mesma conclusão numa população em UCI francesa. Nesse, houve maior sucesso na 1ª-passagem. Aqui, além de maior sucesso na 1ª-passagem (80% vs 70%), verificou-se melhor visualização glótica, o que pode explicar os resultados. Ainda apenas gerador de hipóteses, diria, mas já são 2 estudos retrospectivos em países diferentes. A crítica poderá ser que, à frente de ambas, já vem a videolaringoscopia, sobretudo depois do recente ensaio. No entanto, para quem faça laringoscopia directa, Macintosh 3 parece ser o caminho.


CASOS CLÍNICOS e SÉRIES DE CASOS

Técnicas, POCUS, Exames & Outros

Utilização interessante de POCUS, num diagnóstico já previamente altamente suspeito. Será POCUS suficiente para confirmar quando a suspeição já é elevada? Talvez não imprescíndivel, mas talvez oblivie a necessidade de eco formal



OPINIÃO

PERSPECTIVA

Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos

O ensaio original (RENOIR) já por aqui andou, e, agora, a EMA fez uma aprovação acelerada para o que é a primeira vacina para RSV em idosos. Ainda só demonstrada protecção em sintomas e doença aguda, pelo que preferiria mais prova antes da aprovação (com as vacinas anti-COVID19, que demonstraram logo à primeira protecção contra doença grave). No entanto, pode ser que tal venha a ser demonstrado no futuro...


FOAMed

Cardiovascular

PAS sobe cerca de 3-4mmHg nos doentes que tomaram paracetamol PO 1g tid ou qid. Limitações: só avaliados desfechos a curto-prazo (4 semanas) e não discriminadas preparações de paracetamol com e sem cloreto de sódio.


Geral, Geriatria & Paliativos

Já tem quase um ano, mas é e por muito tempo será contemporâneo.


Várias pérolas interessantes sobre o encontro de MI/MGF dos EUA de 2023, condensado na ACP. Umas melhores que outras, mas aqui vai o ACP 2023 em 5 minutos sem ser preciso sair do sofá com o poder da FOAM.


Imuno-mediadas

Rituximab volta a ganhar o pódio na batalha contra a azatioprina. Pelo que percebi, já conhecíamos os resultados deste RITAZAREM desde a apresentação no ASN 2019 (4 anos atrás!), mas só agora conhecemos a publicação.


Pneumologia

Muito interessante e relevante. Resumo: quase todas as gasimetrias que fazemos deviam evaporar-se. Têm pouco suporte fisiológico, racional, de prova científica e de pragmatismo na maioria dos casos. Todos deviam ler.


Técnicas, POCUS, Exames & Outros

PET-TC mais sensível e menos específica. Útil sobretudo na suspeita de infecções endovasculaes, neoplasias hematológicas e vasculites de grandes vasos. Na minha prática actual (que tem provável maior acesso a PET que a generalidade do contexto português por ser num hospital privado), diria que é aqui que mais usamos a PET. No entanto, pode não ser aplicável para muita gente. E de qualquer forma, não parece ser o exame ideal para confirmar diagnósticos mas sim para levantar a suspeita inicial, pelo que, apesar de benéfico, poderá não ser imprescindível.


Não conhecia esta aplicação mas fiquei fã só com esta amostra de punção lombar. Curto e grosso!


 

ARA - Aumento de Risco Absoluto | ECA - Ensaio clínico aleatorizado | ITA - Intention-to-treat Analysis | MA - Meta-análise | MBE - Medicina baseada na evidência | NIT - Non-inferiority trial | NNH - Number needed to harm | NNT - Number needed to treat | PPA - Per protocol analysis | RRA - Redução do Risco Absoluto | RS - Revisão Sistemática

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