No substack: esFOAMeados No patreon: esFOAMeados Em podcast: Hipótese Nula
TABELA DE CONTEÚDOS
SINOPSE
🎂 Nata da nata
- Anti-agregação dupla --> Monoterapia precoce com ticagrelor igualmente eficaz e risco hemorrágico (Lancet)
- EAM e Choque --> Suporte mecânico circulatório sem benefício geral (benefício do IMPELLA?) (Lancet)
- Risco de Cdiff --> Todos os antibióticos aumentam risco, mas sobretudo cefalosporinas e lincosamidas (IJAA)
- Depressão --> Psilocibina apenas eficaz na dose mais elevada e comparável a escitalopram (BMJ)
🍰 Nata
ESC 2024 (parte 1)
- IC --> Dapagliflozina tão eficaz quanto metolazona nos doentes com descongestão insuficiente (EHJ)
- Pós-EAM --> Suspensão de BB igual para morte, EAM e AVC (de novo) (ABYSS, NEJM)
- FA --> Ablação demonstrou melhoria real quando comparada com "ablação fingida" (SHAM-PVI, JAMA
- ICFEp --> Finerenona apenas reduziu "eventos de IC"...e não sabemos bem o que isso foi (FINEARTS, NEJM)
- IMitral --> Reparação percutânea "canto-a-canto" (TEER) positivo? Dúvidas (RESHAPE-HF2, NEJM)
- Anti-EixoRAA --> Descontinuação pré-cirurgia sem impacto nas complicações a 1 mês (Stop-or-Not, JAMA)
Outros
- DM2 --> Insulina semanal "efsitora" não-inferior a insulina ultra-longa diária deglidec (QWINT-2, NEJM)
- Alopécia Areata Grave --> Descontinuar baricitinib levou a recorrência quase total (JAMA Dermatology)
- Escabiose (sarna) --> Benzoato de benzilo tópico mais eficaz que Permetrido (BAD)
- Desinfecção hospitalar --> Desinfecção de material reduziu infecções hospitalares? Hmm...não sei (Lancet ID)
- Artroplastia total do joelho --> Tourniquete reduziu concentração local de antibiótico (JAMA NetOpen)
- Hipoxémia grave crónica --> Oxigénio de Longa Duração por 15 horas não-inferior a 24 horas (REDOX, NEJM)
🧾Receita
- Comunicação e Oncologia (ESMO)
- ICFEr e titulação terapêutica (AHA - JACC)
🧐 Observações
- Primários: Projecto Orbis e aceleração (vs regulação) de oncofármacos pela FDA | Pós-colecistectomia e dor abdominal | Pleiocitose cefaloraquidiana e encefalite
☝ Opiniões
- Perspectiva: Neoplasia da mama precoce e uso (pernicioso) de iCD4/6 adjuvante | Aprovações agnósticas: caso do trastuzumab-deruxtecano para sarcoma HER2+
🌎FOAMed
Estatística e Medicina (James McCormack - Sensible Medicine) | "Rastreio" de neoplasia pancreática e exemplo de mau estudo (Vinay Prasad - Sensible Medicine) | SCA e sumário de tratamento baseado nos ECAs (Cardiology Trials)
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REVISÕES SISTEMÁTICAS de ECAs
Cardiovascular
6 ECAs / n~24.000, individual patient level
P - Início de anti-agregação dupla após ICP (com ou sem SCA)
I - Descalação precoce para ticagrelor (média foi 3 meses - desde 2 semanas a 3 meses)
C - Anti-agregação dupla por 12 meses
O 1º » NÃO-INFERIOR MACE em análise por protocolo - 2.8 vs 3.2 %
» MENOS hemorragia clinicamente relevante (BARC 3-5) - 0.9 vs 2.1 %, RRA 1.2 % / NNT 83
» Menos mortalidade por todas as causas - 0.9 vs 1.2 %, RRA 0.3 % / NNT 333
*análise de heterogeneidade com maior benefício de mulheres e doentes com risco hemorrágico
Comentário: Não é surpresa nenhuma no blogue, mas tendo em conta que ainda não o vejo na prática e a publicação científica continua a sair, cá volta. Não sei se acredito totalmente na menor mortalidade, mas não me surpreende, já que eventos hemorrágicos podem ter consequências nefastas. Se o santo graal é o ticagrelor, prasugrel ou clopidogrel...isso é uma questão mais complexa. O que é certo, e já defendido pelas guidelines da ESC, é que podemos descalar um dos 3 após 3 a 6 meses.
Conclusão: Monoterapia com ticagrelor precoce (média de 3 meses após ICP) igualmente eficaz e mais segura.
9 ECAs / n=1.114 (4 ECAs com VA-ECMO / 5 ECAs com suporte ventricular), individual patient level
P - EAM com Choque Cardiogénico
I - Suporte mecânico circulatório temporário
C - Vários
O 1º » IGUAL mortalidade
» MAIS complicações
2º » Menor mortalidade* no subgrupo "jovens com EAMcEST e choque cardiogénico sem risco de anóxia cerebral"?
*à custa do DANGER-SHOCK com o IMPELLA, que foi o 1º a encontrar benefício...mas com críticas
Comentário: Não tenho grande comentário a fazer. Parece que ainda não encontrámos a chave de ouro no suporte circulatório e o único ensaio positivo até agora foi o DANGER-SHOCK, com algumas limitações e ainda não replicado. Suficiente para seguirmos a rota da sacralização do IMPELLA? Alguns dirão que sim. Eu, como sempre, peço cautela.
Conclusão: Suporte mecânico circulatório sem benefício geral no EAM com choque cardiogénico
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Clostridioides difficile Infection Risk Following Different Antibiotics: Insights from Multi-source Medical Data | IJAA
61 ECAs / n=25.931
P - Utilização de antibióticos e infecção a clostridioides difficile
I - Antibiótico
C - Antibiótico ou Habitual
O 1º » MAIS risco de cdiff com cefepime e imipenem/cilastina que piperacilina/tazobactam
Ligeiro maior risco de cdiff com imipenem que meropenem
2º » Análise de fármacovigilância - mais risco com todos, mas sobretudo cefalosporinas orais e lincosamidas
Comentário: Nada de novo, mas é sempre temos condensações da melhor prova existente para sabermos que os melhores estudos nos têm dito até ao momento. Cuidado com cefalosporinas orais e clindamicina, mas não só. No fundo, ter sempre um sobrecuidado de stewardship com a utilização de antibioterapia.
Conclusão: Todos os antibióticos aumentam risco de cdiff, sobretudo cefalosporinas orais, imipenem e clindamicina.
Psiquiatria
20 ECAs (15 psicadélicos / 5 escitalopram) / n~2.700 (800 psicadélicos / 1900 escitalopram), NetworkMA
P - Depressão
I - Monoterapia oral com psicadélicos - Psilocibina, LSD, MDMA ou Ayahuasca
C - Escitalopram
O » APENAS psilocibina em dose-elevada com eficácia comparável / superior a escitalopram
» Efeito de placebo foi INFERIOR nos ensaios da psilocibina vs ensaios do escitalopram
Comentário: Apesar de todo o hype, há muito ainda por responder em relação à psilocibina. Em primeiro lugar, alerto para o número de doentes por ensaio que salta logo à vista: nos psicadélicos, temos 800 doentes / 15 ensaios = 53 doentes por ensaio ; no escitalopram, temos 1900 doentes / 5 ensaios = 380 doentes por ensaio. Mesmo que o número de doentes nos ensaios do escitalopram não seja extraordinário, quando comparado com o dos psicadélicos parece um prémio do euromilhões. Depois, porque é que o efeito placebo nos ensaios da psilocibina foi inferior? Tenho algumas teorias em mente, que passam por participantes mais sugestionados em direcção à intervenção.
Conclusão: Psicadélicos, no geral, não foram superiores a escitalopram. Psilocibina em dose-elevada talvez comparável
ENSAIOS CONTROLADOS E ALEATORIZADOS
ESC 2024 - PARTE I
n=3.698, NIT (3%), não-oculto, multicêntrico em 39 centros de França, 2018-2022
P - EAM há >6M + BB (qualquer agente ou dose) + FEj>40% + Sem IC, arritmia, enxaqueca ou HT descontrolada
Basal: FEj~60% (40-50% em apenas 20%) | Bisoprolol em 70% | ~3A entre EAM e aleatorização | 23% prasugrel ou ticagrelor
I - Interrupção de BB (não necessariamente logo, podia ser desmame)
C - Continuação de BB
O 1º » Pior desfecho composto - 23.8 vs 21.1 %, ARA 2.7 % (<0.1 a 5.5), HR 1.16 (1.01 a 1.33), p=0.44 (não-inferioridade)
IGUAIS morte total, EAM e AVC após 3 anos - 4 %, 2.5 % e 1 %
Mais hospitalizações por causas cardiovasculares após 3 anos - 18.9 vs 16.6 %
2º » Igual qualidade-de-vida
Comentário: Pois é, alguém encontrou a galinha dos ovos de ouro aKa "hospitalizações/internamentos por causa específica" e agora temos a solução para ensaio positivo. Não me está a apetecer comentar muito sobre o tema, já falámos muito dele aquando do recentíssimo REDUCE-AMI e, caso queiram, oiçam o TWIC do John Mandrola de 30 de Agosto (ou leiam, no site do medscape). Mas queria apenas fazer este comentário simples: desde quando é que só nos passámos a interessar por hospitalizações por certas causas? E desde quando é que é equivalente pormos num mesmo desfecho composto isto e morte? Falamos duma coisa séria, morte. Achamos igual? Eu cá, não.
Conclusão: Suspensão de BB foi igualzinha para todos os desfechos relevantes como mortalidade geral e cardiovascular e qualidade de vida. Apenas não foi não-inferior para hospitalizações específicas...mas não mediram hospitalizações totais (o que começa a ser a norma nos ensaios da cardiologia).
n=126, duplamente-oculto, 2 hospitais terciários, Reino Unido, 2020-2024
P - FA + sem FA persistente longa-data, ablação prévia, AEcm>5.5 ou Fej<35%
Basal: ~67A | Diagnóstico<->Ablação 2A | AFNET score ~53 | FA persistente em 80%
I - Ablação Real
C - Ablação "Mascarada"
O 1º » MELHOR carga de FA aos 6 meses - 60 vs 35 %, RRA 25% / NNT 4
2º » Melhor qualidade de vida nas escalas AFEQL e SF-36-GH
Comentário: De louvar estes autores ingleses. Felizmente, os ingleses têm-nos habituado a interessantes ensaios "sham" ou "mascarados" na cardiologia, como os ORBITA e ORBITA-2 na intervenção coronária percutânea. Agora, é a vez da ablação de fibrilhação auricular. Até então, havia ensaios mas nenhum deles tinha usado ocultação pela dificuldade implícita e muitos suspeitavam se parte do benefício não seria placebo e viés de selecção. Daí este ensaio, em que os doentes passam por uma simulação de intervenção e não ficam a saber se foi feita real ablação ou não. Mesmo que possamos discutir a real implicação da carga de FA, uma redução absoluta de 25% é mesmo muita fruta e foi acompanhada em melhoria na qualidade de vida. De notar que também houve melhoria no grupo de controlo, pelo que não se exclui totalmente algum efeito de placebo. Também é sempre difícil garantir ocultação total. Pelos vistos, ainda temos 2 ensaios a decorrer, pelo que aguardaremos para integrar tudo. Leiam o John Mandrola no TWIC.
Conclusão: Ablação real de FA é realmente eficaz em reduzir carga de FA e sintomas / qualidade de vida.
n~6.000, duplamente-oculto, multicêntrico e internacional em 37 países, 2020-2023
P - IC sintomática II-IV (doença estrutural e NTpBNP elevado) + FEj>40%
Basal: FEj ~53% | FEj 40-50% em 1/3 | NTpBNP~1000 | NYHA III-IV em 1/3 | ~72A | 60% c/ IC e internamento prévio | DFGe~60% |
I - Finerenona 20 ou 40 mg PO qd
C - Placebo
O 1º » Menos eventos de IC no hospital* ou morte CV após 32M - 36 vs 42 %, RR 16% / HR 0.84 (0.75-0.95), p=.007
Igual mortalidade CV após 32M - 8.1 vs 8.7 %, HR 0.93 (0.78–1.11)
Menos eventos de IC no hospital* (SU ou internamento) após 32M - RR 18% / HR 0.82 (0.71-0.94), p=.006
2º » Igual mortalidade total - 16.4 vs 17.4, HR 0.93 (0.83-1.06)
Igual NYHA aos 12 meses
Melhor? KCCQ (sintomas de IC) aos 12M - 8/100 vs 6.4/100, dif. 1.6 (0.8-2.3), p<.001
Iguais eventos renais - 2.5 vs 1.8, HR 1.33 (0.94–1.89)
Mais hipercaliémia - K > 5.5 em 14 vs 7 % | K > 6 em 3 vs 1.4 %
Mais PAS<100 - 18.5 vs 12.4
Comentário: Antes de começar, tenho de declarar o conflite de interesse: fui sub-investigador do meu hospital deste ensaio, o que significa apenas que participei no processo de inclusão de doentes, nomeadamente no rastreio, e até acabei por ser pago por isso. No entanto, não participei no desenho de nada do ensaio, nem sequer na monitorização dos doentes (o hospital tem uma equipa dedicada a isso e um investigador principal). Vou tentar ser imparcial na crítica. Mas mesmo sendo imparcial...não fico muito convencido. Em primeiro lugar, a única coisa que foi claramente melhorada foram eventos de "worsening heart failure", que foram definidos como "internamentos por IC" ou "idas ao SU por IC". A mortalidade não foi melhorada, houve mais hipercaliémia e hipotensão, e eu argumentaria que os sintomas não foram claramente melhorados, pois a NYHA (mais usada e padronizada) manteve-se igual e os 2 pontos em 100 na escala KCCQ não são quase nada. Em segundo, voltemos aos "eventos de IC". Quantos destes foram hospitalizações ou internamentos? Não sei, mas gostaria. Por último, mesmo que sejam internamentos por IC...caímos na mesma poça enlameada dos últimos anos de ensaios na IC, nomeadamente na ICFEp: então e os internamentos totais?? As pessoas não estão muito interessados em saber porqué que o seu internamento foi rotulado (sim, é sempre um rótulo de alguém pelo que confere logo um grande grau de subjectividade) de "por IC" ou "por pneumonia". Querem é estar menos vezes (e menos tempo, já agora) internadas! Não percebo porque continuamos a ignorar este desfecho nos ensaios da ICFEp. Já começa a parecer sistemático e não queremos aranhas no sistema.
P. S. - Um últissimo pormenor é que a maioria dos doentes não tinham iSGLT2...se acreditarmos no papel destes na ICFEp (e para o fazermos, temos de acreditar no valor de internamentos por causa única........), não conseguimos saber se o resultado seria na mesma este se a maioria estivesse sob iSGLT2. Percebem o arame em que estamos metidos?
P. S. 2 - Também resta saber qual o comportamento da finerenona contra espironlactona (ou até eplerenona).
Conclusão: A finerenona, um análogo sintético não-esteróide da espironolactona, melhorou "eventos por IC"...sem ter melhorado mais nada e sem sabermos se esses eventos levaram a mais internamentos por IC ou até totais.
n=505, não-oculto, multicêntrico em 30 centros e 9 países
Este ensaio supostamente positivo levanta problemas semelhantes aos do anterior, pois apenas se viu redução de internamentos por IC e alguma melhoria em sintomas...com a agravante de, ao nem haver ocultação, o benefício pode ser ainda mais sobrestimado. É o 3º ensaio no tema em que o 1º foi negativo, o 2º positivo e agora este um "ehm".
n=2.222, não-oculto, multicêntrico em 40 centros em 1 país, França, 2018-2023
P - Cirurgia major não-cardíaca
I - Descontinuar inibidor do eixo renina-angiotensina-aldosterona >48h antes da cirurgia
C - Manter inibidor do ERAA
O 1º » IGUAIS mortalidade e complicações aos 28 dias
2º » Menos hipotensão intraoperatória - 41 vs 54 %, RRA 13 % / NNT 7.7, RR 1.31 [95% CI, 1.19-1.44]
Iguais todos os outros desfechos (lesão renal, falência de órgão, dias de internamento, etc.)
Comentário: Nada de muito supreendente. Acho que nunca esperaríamos que, numa população geral, esta suspensão levasse a desfechos incrivelmente superiores...mas ainda bem que o ensaio foi feito, pois ficamos a saber os reais desfechos. Vemos que essa descontinuação apenas leva a menos hipotensão intraoperatória, mas sem levar a vantagens em desfechos orientados ao doente (não esquecer que, hipotensão por si só, é um desfecho pouco relevante...e, na verdade, até eventualmente variável, pois pode ser definido de forma diferente).
Conclusão: Descontinuação de inibidores do eixo RAA pré-operatorariamente não melhorou desfechos relevantes.
OUTROS
Cardiovascular
Dapagliflozin vs. metolazone in heart failure resistant to loop diuretics | European Heart Journal
n=61, não-oculto, multicêntrico em 7 centros do Reino Unido, 2021-2023
P - Internamento por IC + Descongestão insuficiente: Perda de peso < 1kg ou BH > -1L em 24h
I - Dapagliflozina 10mg por 1 a 3 dias
C - Metolazona 5-10mg por 1 a 3 dias
O 1º » IGUAL perda de peso » -3 (+- 2.5) vs -3.6 (+- 2.0) kg após 3 dias, dif. média 0.65kg (−0.12 a 1.41), p=0.11
2º » Igual perda de peso por 40mg de furosemida » -0.15 vs -0.25 kg, dif. média −0.08 (−0.17 a 0.01), p=0.10
» Iguais mudanças na congestão pulmonar e na avaliação de volume
» Iguais EAs gerais
» Mais hipoNa, hipoK e elevação de ureia e creatinina com metolazona
Comentário: Ensaio pequeno mas, na verdade, com poder suficiente para o desfecho primário contínuo de perda de peso (quando o desfecho é contínuo e não binário, como no ORBITA, não é necessária amostra tão grande). Outro aspecto que destaco foi a comparação directa entre dois fármacos, em que já sabíamos que um (metolazona) é eficaz no reforço diurético e até utilizado frequentemente no bloqueio sequencial de nefrónio. Era sempre melhor um terceiro braço com placebo mas enfim, não podemos ter tudo o que queremos. Quanto ao outro fármaco, até já suspeitávamos do seu efeito diurético, mas não sabíamos como enquadrá-lo com os outros diuréticos (sobretudo metolazona e acetazolamida). Portanto, fico satisfeito em confirmar que a dapagliflozina (e os iSGLT2, duvido que haja efeito de classe) seja um diurético eficaz e igualmente eficaz mas com menos efeitos analíticos que a metolazona!
Conclusão: Nos doentes internados por IC descompensada com descongestão insuficiente, dapagliflozina foi tão eficaz quanto a metolazona, e até com menos efeitos analíticos potencialmente perniciosos.
Endocrinologia
n=928, não-oculto, multicêntrico e internacional em 10 países, 2022-2024
Comentário: Insulina semanal "efistora", pelo vistos outra nova insulina semanal além da isodec, demonstrou não-inferioridade em comparação com a ultra-longa degludec em termos de eficácia. Boa. Agora, será equivalente a isodec? E mais...qual será o preço destas insulinas quando começarem a entrar em grande? Estimo que muitos euros. Fianlizando, parece que houve um pouco mais hipoglicémia com esta (se não me engano, com a isodec houve menos).
Conclusão: Insulina semanal "efsitora" não-inferior a insulina degludec na eficácia glicémia...mas mais hipoglicémia?
Imuno-mediadas
n=154 re-aleatorizados na manutenção (654 no ensaio de indução), 70 centros em 3 países, duplamente-oculto, 19-23
P - Alopécia Areata Grave + Resposta a 52 semanas de indução
I1/I2 - Desmame para baricitinib 2mg ou Descontinuação
C - Manter baricitinib 4mg
O 1º » MAIS recorrência às 152 semanas (100 semanas de manutenção) - 80 vs 7 %, ARA 73 % / NNH 1.4
Comentário: Não é preciso grandes comentários. Dentro desta população seleccionada de doentes que já tiveram uma boa resposta com 52 semanas de baricitinib, o acto de reduzir ou mesmo descontinuar baricitinib leva a recidiva em quase todos os doentes - NNH de 1.4. Seria preciso mais tempo? Será tempo indefinido? Não sabemos.
Conclusão: Na alopécia areata grave com boa resposta a 52 semanas de indução de baricitinib, reduzir ou descontinuar barictinib levou a recidiva em quase todos os doentes.
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
n=110, duplamente-oculto, 1 hospital em Salzuburgo/Áustria, 2022-2023
P - >12A (média: ~28A) + Escabiose (não-crostosa): Lesões típicas + prurido + confirmação por exame dermoscópico
I - Benzoato de benzilo 25% tópico
C - Permetrina 5% tópico
O 1º » MUITO MELHOR cura confirmada por dermoscópio - 87 vs 27 %, RRA 60 %, NNT 1.7
2º » Mais "sensação de queimadura" - 47 vs (0?) % (mas sem resultar em descontinuação)
Comentário: É um tema que nem todos adoramos mas não deixa de ser importante. Neste caso, parece até que foi o 1º ECA a comparar o permetrido com o benzoato de benzilo. Em primeiro lugar, fico duplamente impressionado com a baixa eficácia do permetrido, o fármaco padrão-de-ouro e que eu já prescrevi mais do que uma vez na urgência, e a elevada eficácia do benzoato de benzilo, fármaco que não estou (e acho que não estamos?) habituado a prescrever. Falamos aqui de um impressionante NNT de 1.7, algo que muito raramente vemos. Por outro lado, queria pedir alguma calma. O ensaio é muito pequeno e não são apresentadas as características basais na habitual tabela 1. Porquê?? Seriam os grupos parecidos? Não sei. Por enquanto, sendo ambos tópicos e "pouco ofensivos" (não gosto muito de usar "inofensivo", nunca se sabe), talvez seja suficiente para mudar a prática para BB em 1ª-linha.
Conclusão: Benzoato de benzilo tópico muito mais eficaz que permetrido na cura de escabiose (não-crostosa).
n~5.000 / 5 hospitais-clusters, Austrália, 2022-2023
Embora queira acreditar nestes resultados (e talvez até acredite), em que a limpeza e desinfecção por rotina com 3 horas extra diárias por 21 trabalhadores treinados e orientados para o efeito levou a redução de infecções hospitalares, este ensaio por si só não é de todo suficiente para conclusões. As duas principais limitações são os desfechos terem sido reportados e não centralmente medidos e a não-ocultação dos restantes profissionais do hospital, levando-os teoricamente a preocuparem-se mais com as infecções durante a intervenção. Ainda assim, fica, pelo a menos, a prova de que com "3h extra de limpexa +- extra-zelo" consegumos reduzir infecções.
n~59, 1 centro académico, Montreal/Canadá, 2022-2023
Interessante. Pelos vistos, a atrtoplastia total do joelho é realizada com ou sem torniquete, mas a utilização de torniquete está associada a maior risco de infecção, não sabendo exactamente porquê. Neste ensaio original, a utilização de torniquete reduziu a distribuição de cefazolina pelos tecidos adiposo, sinovial e ósseo (medida 60 minutos após infusão) e, mais importante, a concentração tecidual da mesma ficou abaixo da concentração mínima inibitória (MIC) dos principais patogéneos locais.
Pneumologia
n=241 (de 1.693 rastreados), ITT, não-oculto, multicêntrico mas 1 país (20 centros), Suécia, 2018-2022
P - Adultos com indicação para OLD - PaO2<55mmHg ou SatO2<88% ou PaO2<60mmHg se IC ou Policitémia (Htc>0.54)
Basal: ~75A | 89% ex-fumadores | ~70% DPOC e ~15% Fibrose Pulmonar | PaO2~50mmHg, SatO2~80%, PaCO2 ~43
I - Oxigenoterapia de Longa Duração (OLD) por 24 horas
C - Oxigenoterapia de Longa Duração (OLD) por 15 horas
O 1º » IGUAIS hospitalizações ou mortes por todas as causas
2º » Iguais eventos adversos
Comentário: Desde que, em 1980 (há quase 50 anos!!), foram publicados 2 ensaios sobre oxigenoterapia de longa-duração na insuficiência respiratória na DPOC, onde se viu redução de mortalidade com OLD, esta tem sido recomendada por rotina. Sempre me impressionou a forma como adoptámos esta intervenção chatíssima e onerosa com base em 2 ensaios de pequena amostra (um deles com <100 e o outro com <300 doentes) sem sequer termos tendado replicar novamente num grande, mluticêntrico e internacional ensaio. Pois bem, ao menos agora ficamos a saber que 15 horas é equivalente a 24 na insuficiência respiratória crónica (sobretudo, mas não só, por DPOC). Isto pode pode ser muuuuito boa notícia para os doentes! Alarme para algum desequilíbrio nas características basais, num ensaio onde apenas um pequena percentagem dos doentes rastreados foi aleatorizada, o que levante dúvidas sobre a existência de uma verdadeira e orgânica alocação. De qualquer forma, no final pergunto: para quando uma replicação dos ensaios originais?
Conclusão: OLD na hipoxémia crónica grave por 15 horas igual a 24 horas nos "desfechos maiores".
NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICAS - GUIDELINES
Cardiovascular
Não que nos surpreenda pela prática e pelo recente e famoso STRONG-HF, mas para ficar a nota para quem quiser consultar que a AHA fez um reforço para uma rápida titulação dos 4 pilares terapêuticas da ICFEr.
Nota: continuo a defender que o ensaio não nos responde se basta iniciar as 4 classes precocemente ou se temos mesmo de titular até à frase conhecida de "dose máxima tolerada" para atingir os desfechos encontrados, e suspeito (de acordo com a prova geral existente na terapêutica e farmacologia) que o mais relevante seja mesmo começar e não necessariamente titular desenfreadamente, arriscando mais eventos adversos e descontinuações.
Oncologia
A comunicação médica (entre pares, com doentes, familiares, etc.) é um skill (como se diz hoje) que não só se adquire e treina com estudo teórico e aplicação prática, como todos temos responsabilidade de a desenvolver, assim como desenvolvemos outras ferramentes como fisiopatologia, aplicação terapêutica, raciocínio clínico, etc. Fico contente pela tomada de posição da ESMO ao ter desenvolvido uma norma de orientação dedicada a este skill.
ESTUDOS OBSERVACIONAIS
PRIMÁRIOS - SUB-ANÁLISE / COORTE / CASO-CONTROLO / INQUÉRITOS / A. ECONÓMICAS
Cirurgia, Ortopedia & MFR
n~700 (2/3 dos 1.000 originais), subanálise do ECA SECURE, seguimento aos 5 anos, Países Baixos
Neste ensaio, já se provara originalmente que uma maior cautela na colecistectomia de doentes com colelitíase sintomática, nomeadamente operar apenas aqueles com a clássica cólica biliar como descrita nos livros, leva a menos cirurgias sem se perder eficácia. No entanto, mesmo aí, a dor abdominal mantinha-se em 40% dos doentes de ambos grupos após 1 ano. Agora, após 5 anos, manteve-se a menor necessidade de cirurgia no grupo de "cirurgia cautelosa" mas também se manteve a dor abdominal em 1/3 dos doentes...será mais um exemplo de nocebo? Seria já uma suposta dor abdominal inespecífica que originalmente não se relacionava com a colelitíase? Não sei, mas fica o dado.
Meta-investigação & MBE
FDA-approved cancer drugs reviewed through Project Orbis— harmonizing up or down? | LancetO - Sensible Medicine
Medidas que deveriam servir para regular...estão a servir para desenfrear e acelerar? Preocupante.
Neurologia
n=597, coorte retrospectiva, EUA/Maryland&Texas
A ausência de pleiocitose (=>5céls/uL) no LCR não significa que o doente não possa estar em processo de vir a ter encefalite. Neste estudo, aconteceu em 20% dos doentes. Portanto, pode ser essencial começar aciclovir (pensando em encefalite herpética) depois da punção lombar enquanto aguardamos pela microbiologia. Em caso de dúvida, repetir PL após uns dias (por exemplo, 48 horas).
OPINIÃO
PERSPECTIVA
Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos
Artigo muito original e até com um toque de arrojado e provocador que, em primeiro e mais importanto lugar, prova que a escrita científica pode ser bem escrita e opinativa, desde que no devido lugar de artigo não-primário. Em segundo lugar, vale pela discussão de elevado grau científico (ou seja, com estudos de alta qualidade e meta-análises e não o cherry picking habitual) sobre o acto zombesco de "PCR e VS ad eternum". Para terminar, e caso vos deixe mais satisfeitos, foi co-escrito por vários dos grandes da infecciologia norte-americana (e outros) do momento.
Oncologia
Mais um exemplo de malefício garantido e benefício incerto.
FDA "agnostic" approvals: trastuzumab deruxtecan targeting HER2 in sarcoma | Drug Development Letter - JACS
Outro...desta vais mais periniciosamente agnóstico.
FOAMed
Cardiovascular
Resumo de toda esta (excelente) série.
Meta-investigação & MBE
Uma das melhores e mais simples explicações que já li. Para ler e reler.
Oncologia
Uma lição de (má) ciência)
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